JESUS
MOSTRANDO-ME AS SUAS DIVINAS CHAGAS
– Uma
noite, apareceu-me Jesus em tamanho natural, despido, apenas com uma
faixa à cinta e nas suas divinas mãos, pés e lado, estavam abertas
profundas chagas. O sangue escorria em abundância. Da chaga do lado
escorria até à cintura, atravessando a faixa, indo cair ao chão.
Jesus sentou-se ao meu lado, ficando com
as
pernas ao dependuro. Beijei com muito amor as chagas das mãos e
ansiava por beijar as dos pés. Como estava deitada, não lhes
chegava, e nada disse a Jesus. Mas Ele, que conheceu os meus
desejos, com as Suas mãos tomou um pé, levantou-o e deu-mo a beijar;
depois o outro, deixando-os cair para a mesma posição. Depois,
contemplei a chaga do lado e todo o sangue que dela corria. Muito
compadecida, atirei-me para os braços de Jesus e disse-Lhe: «Ó meu
Jesus, quanto sofreste por meu amor!» Fiquei um poucochinho
encostada ao peito de Jesus e depois desapareceu-me Nosso Senhor.
Escusado será dizer que jamais se apagará da minha mente tudo isto e
recordarei sempre, como sempre me estivesse presente. Sinto o meu
coração ferido ao recordar este quadro. Só por obediência e amor a
Jesus falo nisto. Penso que a apresentação de Nosso Senhor neste
estado seria a prepara-me para o que agora vou descrever. Que Ele me
dê forças e a Sua graça para o poder fazer.
Em 23
de Julho de 1938, escrevia: «Jesus é a minha força, é o meu amor, é
o meu esposo. Deixai, meu Jesus, que eu, a Vossa a louquinha de
amor, Vos diga, não com os lábios mas com o coração: só a Vós
pertenço.
Não
tenho nada, nada que não seja de Jesus.
É bem
duro falar assim, quando se sente o contrário! Nas horas mais
amargas da minha vida, nos dias de tanta luta, em que o demónio me
diz o contrário, só o contrário.
Maldito! Não te pertenço! Tu és só digno de desprezo! És a mentira!
Jesus é
todo meu e eu sou toda de Jesus. Coação meu, grita alto, muito alto
ao teu Jesus, que O amas! Sim? Que O amas mais que todas as coisas
da terra e do Céu!!!
Sou de
Jesus na alegria, sou de Jesus na tristeza, sou de Jesus nas trevas,
nas horríveis tribulações, na pobreza, no abandono total.
Por
Jesus sofro tudo para O contemplar, para salvar as almas.
Enviai,
Jesus à Vossa Alexandrina, à Vossa vítima, tudo quanto se possa
imaginar, tudo o que houver e que se possa chamar sofrimento. Com
Vós, Jesus, com o Vosso divino auxílio e o da Vossa e minha querida
Mãezinha, tudo venço. Nada temo.
Eu
beijo-te, eu abraço-te, ó Cruz bendita do meu Jesus!!!»
O MEU
RETIRO ESPIRITUAL
– Sempre que ouvia falar em pessoas que iam fazer um retiro, eu
dizia: «Todos o fazem, só eu não! Eu não sei o que é um retiro.»
Cheguei
a dizer isto várias vezes na presença do meu Director espiritual.
Este prometeu-me pedir licença ao Sr. Padre Provincial e, uma vez
que ele o autorizasse, viria aqui fazer-me um. Por altos desígnios
de Deus, a licença foi concedida e, em 30 de Setembro de 1938, veio
o meu Padre espiritual principiá-lo.
Já há
tempos que sentia grandes agonias na minha há alma e por vezes
prestes a cair em assustadores abismos. Nestes dias redobraram os
meus sofrimentos. Os abismos eram aterradores. A justiça do Pai
Eterno caía sobre mim e Ele bradava-me repetidas vezes: «Vingança,
vingança, etc.» Aumentavam os meus sofrimentos da alma e do corpo. É
impossível descrevê-los, só sentidos e presenciados. Passava os dias
e as noites rolando pela cama, a ouvir a voz assustadora do Eterno
Pai.
Na
manhã de 2 de Outubro de 1938, disse-me Nosso Senhor que iria passar
por toda a Paixão, do Horto ao Calvário, só não chegaria ao
«Consummatum est». Seria a primeira vez no dia 3 e depois ficaria a
passar pela Paixão todas as sextas-feiras, pouco depois do meio-dia,
às 3 horas, mas na primeira vez ficaria até às 6 horas, a desabafar
comigo, fazendo-me os Seus queixumes.
Não
disse que não a Nosso Senhor. Preveni o meu Director espiritual de
tudo que Nosso Senhor me disse. Esperava o dia e a hora com grande
aflição, pois nem eu nem o meu Director fazíamos ideia do que se ia
passar. Na noite de 2 para 3 de Outubro, se era grande a agonia da
alma, também foi grande o sofrimento do meu corpo, começando a
vomitar sangue e a sentir dores horríveis. Vomitei bastantes dias
seguidos e, durante cinco dias, não tomei alimento algum. Foi neste
sofrimento que eu fui para a primeira crucifixão. Que horror eu
sentia em mim! Que medo e até pavor!... É indizível a minha aflição.
PRIMEIRA CRUCIFIXÃO
– Depois do meio-dia, veio Nosso Senhor convidar-me assim: «Olha,
minha filha, o Horto está pronto e o Gólgota também, aceitas?»
Senti
que Nosso senhor me acompanhou por algum tempo no caminho do
Calvário, depois senti-me sozinha, vendo-O a Ele lá no alto, em
tamanho natural, pregado na cruz. Percorri todo o caminho do
Calvário sem O perder de vista… era junto d’Ele que eu tinha de ir
parar.
Vi por
duas vezes Santa Teresinha. Na primeira vez, via vestida de freira,
entre duas irmãs, à porta do Carmelo. Na segunda, vi-a cercada de
rosas e envolvida num manto celestial.
Nota –
Dado que a Alexandrina nunca se dispôs a descrever a Paixão,
transcrevemos a carta seguinte, em que descreve ao seu Director
espiritual os sentimentos da sua alma durante as horas que precediam
a Paixão.
Balasar, 7/4/1939.
«Busco um bocadinho de alívio para o meu sofrer. Espero a hora da
minha crucifixão. Nem posso falar. O coração está em marcha
acelerada. É uma revolta, é uma barafunda na minha alma. O peso
esmaga-me. Trevas, noite medonha e triste; estou num abandono
tremendo. Figura-se-me que ando no meio de todo o ódio, de tribunal
em tribunal. Pobre de mim! E não recebi Jesus! Mas confio que Ele
suprirá a falta nas Comunhões espirituais, apesar do nojo que tenho
de mim mesmo e horror à minha enorme miséria.
Ontem a temperatura acalmou. Que horror eu sentia! O meu corpo
era-me trespassado todo, de um lado ao outro, com agudos ferros. Que
momentos tão terríveis! Apesar do bocadinho de alívio, fiquei sempre
numa noite escuríssima, numa tristeza profunda. A noite, passei-a,
posso dizê-lo, quase que toda a fazer companhia a Nosso Senhor
Sacramentado e concentrava-me um pouquinho em toda a tragédia da
noite. Parecia que Jesus me convidava ao Horto. Que movimento de
gente! Mas tudo isto era sentido na minha alma.
Ai,
meu padre, parece que tudo isto que estou a dizer-lhe é mentira! Ai,
tantas dúvidas!... Ai, ai os medos de toda a Paixão! Já disse à
Deolinda: do modo que sinto o coração, é preciso um milagre para eu
resistir. Jesus seja comigo! Não digo mais nada, que não posso.»
Aqui,
interrompeu a carta, porque logo se seguiu a Paixão. Sua irmã
Deolinda assim no-la descreve:
«Ai,
meu padre, o que foi o dia de sexta-feira santa! É bem sexta-feira
da Paixão! Antes de principiar, oh, como se via nela cara de
aflição! Ela temia passar este dia! E dizia-me: Ai, se eu vejo este
dia passado!... Eu confortava-a quanto podia e acariciava-a; apesar
de eu também estar cheia de medo e muito aflita.
Durante a Paixão, eu não podia passar sem chorar e vi correr
lágrimas pelas faces de quase todos os assistentes. Que espectáculo
tão comovedor! A agonia no Horto foi muito demorada e aflitiva…
Ouviam-se gemidos muito profundos e por vezes via-se soluçar. Mas a
flagelação e a coroação de espinhos é que foi! Os açoites forma
tomados de joelhos, com as mãos (como que) atadas. Eu cheguei-lhe
uma almofada para debaixo dos joelhos e ela retirou-se dela, não
quis. Tem os joelhos em mísero estado. Os açoites não tinham conta!
Levaram tanto tempo! Ela desfalecia tanto! Os golpes na cabeça (com
a cana na coroa de espinhos) foram inumeráveis. Vomitou por duas
vezes durante a Paixão: era água, porque mais nada tinha que
vomitar. O suor era tanto que os cabelos estavam empastados e, ao
passar-lhe a mão por cima de toda a roupa, ficava molhada. Quando
acabou a coroação de espinhos, ela parecia um perfeito cadáver.
O
Sr. Cónego Borlido veio assistir com mais duas pessoas. Também veio
o Sr. Dr. Almiro de Vasconcelos com a esposa e a irmã D. Judite.»
Continua a Alexandrina:
Durante
alguns dias foi doloroso todo o meu sofrimento. Continuaram os
vómitos de sangue e uma sede abrasadora, que não havia água que me
saciasse. Eu não podia beber, mas passava dias e noites seguidas com
a água a corre pela boca, não podendo engolir nenhuma. Cheguei a
cansar-me e a cansar as pessoas que me tratavam. Depois de passar
muita e muita água pela minha boca ainda exclamava: «Dai-me água,
muita água, pipas de água!» Parecia-me que estava a arder, nada
havia que me saciasse.
Sentia
uns cheiros horrorosos; não queria que as pessoas se aproximassem de
mim, porque todas e tudo me cheirava a cães mortos. Davam-me
violetas e perfumes a cheirar, mas tudo repelia, porque era sempre o
mesmo mau cheiro que me atormentava.
Não
passei sem sentir mau paladar nos dias em que me alimentava e, desde
que comia, de tudo tinha nojos, porque tudo me sabia aos maus
cheiros que tinha.
Quanto
não teria eu que dizer sobe isto, se pudesse descrever tudo quanto
sinto! Falta-me a coragem, pois custa-me tanto lembrar estas
coisas!... |