5 de Janeiro de 1945 – Sexta-Feira
Sinto necessidade de escrever e não queria dizer nada do que me
vai na alma. Faço-o por obediência. Que tristes horas correm
para mim, que grande agonia se apoderou da minha alma. Sinto que
tantas ruas são
banhadas com o meu sangue. Vejo tanta revolta e
indignação. Estou tão humilhada! O meu corpo está como uma só
chaga. O sangue da cabeça causado pelos espinhos banha-me todo o
corpo. Eu de braços abertos entrego-me à cruz, deixo-me
crucificar. Estou num brado contínuo:
– Pai, meu Pai, também tu me abandonaste! Sou a tua vítima,
dou-me a ti pelas almas. Ó meu Deus, se eu tivesse querer,
preferia o inferno a este sofrimento e ao tempo dos meus
colóquios conVosco. Sim, meu Jesus, se eu estivesse no inferno,
em vez de Vos falar e Vós a mim, não temia enganar-me nem
enganar ninguém e não seria tão perseguida do mundo. Perdoai-me,
Jesus, o meu desabafo! É o horror que tenho ao engano, à
mentira; é o temor que tenho de mim mesma, é o medo das
sextas-feiras. Se elas desaparecessem e eu desaparecesse também
no Vosso amor infinito! Venha todo o sofrimento, venha a cruz,
venha a morte, tudo abraço, sou a Vossa vítima, Jesus.
Destes sofrimentos passei para um inundamento de luz, paz e
doçura. Jesus demorou a falar-me, deixou-me por bastante tempo
gozar daquilo que era d’Ele. Falou-me depois.
– Minha filha, cheia de graça, pureza e amor. Minha filha, rico
tesouro daquilo que é divino. És cheia de graça, pureza e amor,
és rica do que é divino, porque guardaste em ti com todo o
cuidado, esmero e amor, o que do céu te foi dado. Correspondeste
à graça, és cheia de graça. Minha filha, fonte divina, fonte de
toda a humanidade. És fonte divina, porque em ti existe tudo o
que é divino. És fonte da humanidade, porque a ti vem ela beber
e purificar-se; és água pura, és fonte salvação. Minha filha,
hino de louvor, de amor e reparação. Se pudesses ver o louvor
que recebi, a vassalagem e homenagens angélicas que me foram
dadas no céu pela reparação que me deste, pelas almas que
salvaste com a dor com que te deixaste imolar! Foi um ano cheio
de amor, foi um ano cheio de salvação. Minha filha, flor
angélica, mimo da Trindade divina, mimo de Maria, mimo de toda a
corte celeste. A dor que sofreste embelezou o céu, está adornado
com ela, está escrita a letras de oiro e pedras preciosas. Está
escrita também a ingratidão e a maldade dos homens contra ti e
contra a minha divina causa. Espera-te um ano cheio de amarguras
e também cheio de alegrias, por ti só experimentadas como sol
brilhante que aparece para rapidamente se esconder entre as
nuvens. Nada temas, é esta a tua vida. É vida que dá a vida, é
dor que dá amor. Não te preocupes por nada veres do que fizeste,
do que sofreste, do que amaste. Não sofreste, não deste, não
amaste por ti, tudo me deste a mim. Nada poderás ver no mundo,
tudo passou para a pátria celeste; tudo está de posse do teu
Rei, do teu Esposo. Tudo verás, quando tiveres comigo o teu
encontro eterno. Sofre tudo, aceita tudo com alegria. As tuas
asinhas brancas, as tuas asas de alvura como a pombinha
canseirosa voa ao longe à procura de alimento que dá a vida aos
seus filhinhos. Tu és a vida das almas, a mãe dos pecadores, a
rainha do mundo, a rainha do amor. Minha filha, espelho
cristalíssimo onde toda a humanidade há-de ver-se e à tua
imitação transformar-se. Anseio, anseio por te ver na minha
Pátria, para que todo o mundo conheça e aprenda na tua vida,
minha filha, escola sagrada das ciências divinas. Coragem, vida
que dás a vida, dor que dás amor. Recebe o meu amor divino para
levantar-te do teu desfalecimento e para receberes a vida de que
vives.
O
meu coração recebeu uma infusão de amor, senti as ânsias que Ele
tinha de me ver no céu e senti as homenagens que os anjos davam
a Jesus ao entoar-Lhe um prolongado hino de grande louvor e
agradecimento. Ó quanto me custou separar-me de Jesus para viver
aqui. Que diferença o céu da terra, o amor de Jesus do das
criaturas.
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