PONTOS DE REFLEXÃO
I LEITURA.
Actos 1, 1-11
O texto dos
Atos dos Apóstolos é escrito cerca do ano 80, por isso cerca de 50 anos
após a ressurreição de Cristo.
O ambiente
espiritual das comunidades cristãs é de um certo desalento e desencanto:
o mundo continua igual; a suposta vinda iminente do Senhor como Rei e
Senhor tarda; a monotonia e ritualismo apoderou-se dos cristãos.
É neste
contexto que este texto é escrito.
Esta peque na
secção com que se inicia os Atos dos Apóstolos divide-se em duas partes:
o discurso de despedida e a narrativa da Ascensão.
Lucas começa
por recordar a tradição dos quarenta dias durante os quais se foram
repetindo os encontros do Ressuscitado com os discípulos. Era
necessário. Já se tinham passado umas décadas e tudo começava a ser
posto em causa. Os cristãos têm que estar firmes na fé que receberam,
que Têm de professar e anunciar. Por outro lado estes quarenta dias,
número simbólico, faz a ligação com o Cristo pré-pascal.
Os discípulos
não devem afastar-se de Jerusalém! Porque? Porque Simplesmente a
expansão do Evangelho deve ter como ponto de partida a cidade onde se
realizaram os acontecimentos pascias: paixão, morte e ressurreição.
Lucas quer incutir nos seus ouvintes que a história da salvação teve um
lugar, um povo, umas circunstâncias concretas: Deus é um Deus imanente e
salva a partir de dentro e do concreto.
Os discípulos
interessam-se pelo tempo no qual seria restabelecido o reino de Israel.
A pergunta é feita por dois motivos. Primeiro porque os discípulos ainda
não tinham compreendido a verdadeira dimensão do reino de Deus: seria,
segundo a sua mentalidade, um reino ao estilo dos reinos humanos. Em
segundo lugar porque havia a concepção generalizada que com a efusão do
Espírito se realizaria a irrupção dos últimos tempos, facto que deu
origem à esperança de uma parusia imediata e como Israel estava gravado
na memória de todos pensavam que essa parusia se limitaria
exclusivamente a Israel.
Mediante tudo
isto Jesus responde:
Toda e
qualquer especulação a respeito da proximidade do fim está condenada ao
fracasso. É o Pai que tem a iniciativa em todos os momentos da história
da salvação.
O Evangelho
deve ser pregado ao mundo inteiro, isto é, o Reino não se limitará
exclusivamente a Israel.
Os discípulos
receberão o Espírito Santo para serem testemunhas de Jesus no mundo
inteiro. A Igreja é essencialmente missionária e as fronteiras serão as
do mundo.
A forma como a
Ascensão nos é narrada está condicionada pela imagem ou ideia que os
antigos tinham do mundo. Neste ponto de vista a nossa concepção
modificou-se notavelmente. Os nossos conhecimentos cosmológicos são
muito diferentes dos que eles tinham, por isso nós temos que fazer uma
tentativa de discernimento entre a forma de o apresentar e o facto em
si. Aquilo que Lucas afirma essencialmente é a ida de Jesus para o Pai.
Este facto em si é o mesmo nos tempos de Lucas e nos nossos. As imagens
ou os meios para os descrever estão ao serviço do facto propriamente
dito, como o vestido está sempre ao serviço da pessoa.
II LEITURA.
Ef 1,17-23
Tendo
terminado o hino, Paulo entra no campo da exortação para que os cristãos
possam compreender a que “esperança foram chamados”. Paulo procura
evidenciar a total gratuidade do conhecimento e do alcance do mistério
de Deus. Esse conhecimento não é resultado da investigação humana mas
fruto da ação de Deus . “Ele ilumine os olhos do vosso coração”.
Trata-se do coração no sentido bíblico, do homem considerado na sua vida
interior, do centro da pessoa a quem Deus se dirige. Aqui a fé e a
esperança estão de tal modo entrelaçadas até quase se confundirem.
Acredita-se porque há Alguém acima de nós; espera-se porque esse alguém
tem um poder maior que qualquer estrita capacidade humana.
Aquilo que
“mostra a eficácia da poderosa força” que tem, é algo concreto: a
ressurreição de Cristo.
Neste texto aparece-nos Cristo
como cabeça da Igreja. Afirmar que Cristo é cabeça da Igreja implica que
os dois, Cristo e Igreja, são inseparáveis e que entre as “duas partes”
há uma comunhão total. Ao dizer que Cristo é a cabeça, Paulo procura
acentuar a centralidade de Cristo que dá vida e orientação a todo o
corpo. A Igreja é como que uma “casa” que recebe Cristo e O dá a
conhecer e a comungar ao mundo para realizar o grande projecto da
salvação de todos.
EVANGELHO – Lc 24,46-53
A Ascensão de Jesus para junto de
Deus conclui solenemente o Evangelho de Lucas. Mas antes de desaparecer
aos olhos dos discípulos introduz as Suas testemunhas na leitura cristã
da Sagrada Escritura: tudo tende para Cristo e encontra na morte e
ressurreição do Filho de Deus o seu sentido e realização.
Jesus confia aos discípulos a
missão de levar a todos os homens a salvação realizada no acontecimento
pascal. O evangelista sintetiza: eles devem “pregar o arrependimento e o
perdão dos pecados”. O arrependimento consiste em abrir-se ao Deus que
ressuscitou Jesus, acolhendo a Sua palavra de perdão, e comporta depois
o arrependimento sincero de uma vida passada mal vivida. Para realizarem
a sua missão, os Apóstolos precisam da luz e da força que lhes são
concedidas mediante o envio do “Espírito Santo”, o Espírito Consolador.
A narração da Ascensão conclui a
manifestação visível de Jesus Ressuscitado, e conclui também o
Evangelho. Lucas deu à cena o aspecto de uma solene liturgia final: a um
gesto de bênção de Cristo segue-se um gesto de adoração da parte dos
discípulos. Para estes últimos começa uma nova vida que simbolicamente
parte do “templo”, lugar de presença divina que agora, deste centro de
Israel, quer irradiar por todo o mundo. Domina não a tristeza de uma
partida, mas a “alegria” porque, com a Páscoa do Senhor, chegou o tempo
da salvação.
P. José Granja. |