Prezados irmãos e irmãs!
Hoje
gostaria de vos falar de outra santa que tem o nome de Catarina,
depois de Catarina de Sena e Catarina de Bolonha; falo de Catarina
de Génova, conhecida sobretudo pela sua visão sobre o purgatório. O
texto que descreve a sua vida e o seu pensamento foi publicado nessa
cidade da Ligúria em 1551; ele é dividido em três parte: a Vida
propriamente dita, a Demonstração e declaração do purgatório
— mais conhecida como Tratado — e o Diálogo entre a
alma e o corpo (cf. Livro da Vida admirável e da doutrina
santa, da beata Catarina de Génova, que contém uma útil e católica
demonstração e declaração do purgatório, Génova, 1551). O
redactor final foi o confessor de Catarina, o sacerdote Cattaneo
Marabotto.
Catarina nasceu em Génova, em 1447; última de cinco filhos, ficou
órfã do pai, Giacomo Fieschi, ainda em tenra idade. A mãe, Francesca
di Negro, dispensou uma válida educação cristã, a tal ponto que a
maior das duas filhas se tornou religiosa. Com 16 anos, Catarina foi
concedida como esposa a Giuliano Adorno, um homem que, depois de
várias experiências comerciais e militares no Médio Oriente, tinha
regressado a Génova para casar. A vida matrimonial não foi fácil,
também devido à índole do marido, apaixonado pelo jogo de azar.
Inicialmente, a própria Catarina foi induzida a levar um tipo de
vida mundana em que, contudo, não conseguia encontrar a serenidade.
Depois de dez anos, no seu coração havia um profundo sentido de
vazio e de amargura.
A
conversão teve início a 20 de Março de 1473, graças a uma
experiência singular. Tendo ido à igreja de são Bento e ao mosteiro
de Nossa Senhora das Graças para se confessar, ajoelhou-se diante do
sacerdote e «recebeu — como ela mesma escreve — uma chaga no
coração, de um imenso amor de Deus», com uma visão tão clarividente
das suas misérias e dos seus defeitos e, ao mesmo tempo, da bondade
de Deus, que quase desmaiou. Foi tocada no coração por este
conhecimento de si mesma, da vida vazia que ela levava e da bondade
de Deus. Desta experiência derivou a decisão que orientou toda a sua
vida, expressa com estas palavras: «Basta com o mundo e com os
pecados» (cf. Vida admirável, 3rv). Então Catarina fugiu,
suspendendo a Confissão. Voltou para casa, entrou no quarto mais
escondido e chorou prolongadamente. Naquele momento, foi instruída
interiormente sobre a oração e adquiriu a consciência do imenso amor
de Deus por ela, pecadora, uma experiência espiritual que não
conseguia expressar com palavras (cf. Vida admirável, 4r).
Foi nessa ocasião que lhe apareceu Jesus sofredor que carregava a
cruz, como é frequentemente representado na iconografia da santa.
Poucos dias depois, foi ter com o sacerdote para finalmente realizar
uma boa Confissão. Aqui teve início aquela «vida de purificação»
que, durante muito tempo, lhe fez sentir uma dor constante pelos
pecados cometidos e que a impeliu a impor-se penitências e
sacrifícios para demonstrar o seu amor a Deus.
Neste
caminho, Catarina foi-se aproximando cada vez mais do Senhor, até
entrar naquela que é denominada «vida unitiva», ou seja, uma relação
de profunda união com Deus. Na Vida está escrito que a sua
alma era orientada e ensinada interiormente só pelo dócil amor de
Deus, que lhe concedia tudo aquilo que ela precisava. Catarina
abandonou-se de modo tão total nas mãos do Senhor que chegou a
viver, durante cerca de vinte e cinco anos — como ela escreve — «sem
o intermédio de qualquer criatura, instruída e governada unicamente
por Deus» (Vida, 117r-118r), alimentada sobretudo pela oração
constante e pela Sagrada Comunhão recebida todos os dias, o que não
era comum na sua época. Só muitos anos mais tarde o Senhor lhe
concedeu um sacerdote que cuidasse da sua alma.
Catarina hesitava sempre em confiar e manifestar a sua experiência
de comunhão mística com Deus, sobretudo pela profunda humildade que
sentia diante das graças do Senhor. Foi só a perspectiva de dar
glória a Ele e de poder favorecer o caminho espiritual de outros que
a levou a narrar aquilo que se verificava nela, a partir do momento
da sua conversão, que é a sua experiência originária e fundamental.
O lugar da sua ascensão aos vértices místicos foi o hospital de
Pammatone, a maior estrutura hospitalar genovesa, da qual foi
directora e animadora. Portanto, não obstante esta profundidade da
sua vida interior, Catarina vive uma existência totalmente activa.
Em Pammatone foi-se formando ao seu redor um grupo de seguidores,
discípulos e colaboradores, fascinados pela sua vida de fé e pela
sua caridade. O próprio marido, Giuliano Adorno, foi conquistado por
ela, a ponto de abandonar a sua vida desregrada, de se tornar
terciário franciscano e de se transferir para o hospital, para
oferecer a sua ajuda à esposa. O compromisso de Catarina no cuidado
dos doentes continuou até ao fim do seu caminho terreno, a 15 de
Setembro de 1510. Desde a conversão até à morte, não houve
acontecimentos extraordinários, mas dois elementos caracterizaram
toda a sua existência: por um lado a experiência mística, ou seja, a
profunda união com Deus, sentida como uma união esponsal e, por
outro, a assistência aos enfermos, a organização do hospital e o
serviço ao próximo, especialmente aos mais necessitados e
abandonados. Estes dois pólos — Deus e o próximo — preencheram
totalmente a sua vida, transcorrida praticamente entre as paredes do
hospital.
Estimados amigos, nunca devemos esquecer que quanto mais amarmos a
Deus e formos constantes na oração, tanto mais conseguiresmos amar
verdadeiramente quantos estão ao nosso redor, quem está perto de
nós, porque seremos capazes de ver em cada pessoa o Rosto do Senhor,
que ama sem limites nem distinções. A mística não cria distâncias em
relação ao outro, não cria uma vida abstracta, mas sobretudo
aproxima do outro, porque se começa a ver e a agir com os olhos, com
o Coração de Deus.
O
pensamento de Catarina sobre o purgatório, pelo qual ela é
particularmente conhecida, está condensado nas últimas duas partes
do livro citado no início: o Tratado sobre o purgatório e o
Diálogo entre a alma e o corpo. É importante observar que, na
sua experiência mística, Catarina jamais tem revelações específicas
sobre o purgatório ou sobre as almas que ali estão a purificar-se.
Todavia, nos escritos inspirados pela nossa santa, é um elemento
central, e o modo de o descrever tem características originais em
relação à sua época. O primeiro traço original diz respeito ao
«lugar» da purificação das almas. No seu tempo, ele era representado
principalmente com o recurso a imagens ligadas ao espço: pensava-se
num certo espaço, onde se encontraria o purgatório. Em Catarina, ao
contário, o purgatório não é apresentado como um elemento da
paisagem das vísceras da terra: é um fogo não exterior, mas
interior. Este é o purgatório, um fogo interior. A santa fala do
caminho de purificação da alma, rumo à plena comunhão com Deus, a
partir da própria experiência de profunda dor pelos pecados
cometidos, em relação ao amor infinito de Deus (cf. Vida
admirável, 171v). Ouvimos sobre o momento da conversão, quando
Catarina sente repentinamente a bondade de Deus, a distância
infinita da própria vida desta bondade e um fogo ardente no interior
de si mesma. E este é o fogo que purifica, é o fogo interior do
purgatório. Também aqui há um traço original em relação ao
pensamento do tempo. Com efeito, não se começa a partir do além para
narrar os tormentos do purgatório — como era habitual naquela época
e talvez ainda hoje — e depois indicar o caminho para a purificação
ou a conversão, mas a nossa santa começa a partir da própria
experiência interior da sua vida a caminho da eternidade. A alma —
diz Catarina — apresenta-se a Deus ainda vinculada aos desejos e à
pena que derivam do pecado, e isto torna-lhe impossível regozijar
com a visão beatífica de Deus. Catarina afirma que Deus é tão puro e
santo que a alma com as manchas do pecado não pode encontrar-se na
presença da majestade divina (cf. Vida admirável, 177r). E
também nós sentimos como estamos distantes, como estamos repletos de
tantas coisas, a ponto de não podermos ver Deus. A alma está
consciente do imenso amor e da justiça perfeita de Deus e, por
conseguinte, sofre por não ter correspondido de modo correcto e
perfeito a tal amor, e precisamente o amor a Deus torna-se chama, é
o próprio amor que a purifica das suas escórias de pecado.
Em
Catarina entrevê-se a presença de fontes teológicas e místicas das
quais era normal haurir na sua época. Em particular, encontra-se uma
imagem típica de Dionísio, o Areopagita, ou seja, aquela do fio de
ouro que liga o coração humano ao próprio Deus. Quando Deus purifica
o homem, liga-o com um fio de ouro extremamente fino, que é o seu
mor, e atrai-o a si com um afecto tão forte, que o homem permanece
como que «superado, vencido e totalmente fora de si». Assim, o
coração do homem é invadido pelo amor de Deus, que se torna o único
guia, o único motor da sua existência (cf. Vida admirável,
246rv). Esta situação de elevação a Deus e de abandono à sua
vontade, expressa na imagem do fio, é utilizada por Catarina para
manifestar a obra da luz divina nas almas do purgatório, luz que as
purifica e eleva aos esplendores dos raios fúlgidos de Deus (cf.
Vida admirável, 179r).
Queridos amigos, na sua experiência de união com Deus os santos
alcançam um «saber» tão profundo dos mistérios divinos, no qual o
amor e o conhecimento se compenetram, a ponto de ajudarem os
próprios teólogos no seu compromisso de estudo, de intelligentia
fidei, de intelligentia dos mistérios da fé, de
aprofundamento real dos mistérios, por exemplo daquilo que é o
purgatório.
Com a
sua vida, santa Catarina ensina-nos que quanto mais amamos a Deus e
entramos em intimidade com Ele na oração, tanto mais Ele se faz
conhecer e acende o nosso coração com o seu amor. Escrevendo acerca
do purgatório, a santa recorda-nos uma verdade fundamental da fé,
que se torna para nós um convite a rezar pelos defuntos, a fim de
que eles possam chegar à visão beatífica de Deus na comunhão dos
santos (cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 1032). Além
disso, o serviço humilde, fiel e generoso, que a santa prestou
durante toda a sua vida no hospital de Pammatone, é um exemplo
luminoso de caridade para todos e um encorajamento especialmente
para as mulheres que oferecem uma contribuição fundamental para a
sociedade e a Igreja com a sua obra preciosa, enriquecida pela sua
sensibilidade e pela atenção aos mais pobres e necessitados.
Obrigado! |