"E
quem vos der um copo de água porque sois de Cristo, em verdade eu
vos digo, não perderá a sua recompensa"
(Mc 9,41).
Nestas
palavras evangélicas meditou por muito tempo o cardeal José Bento
Dusmet, por 27 anos arcebispo de Catânia, depois de ter sido por
cerca de duas décadas o abade do histórico mosteiro beneditino de
São Nicolau "de arenis" naquela cidade. Ele se destaca como
testemunha da caridade evangélica em tempos particularmente
atormentados na vida da Igreja, em meio a acalorados conflitos e
profundas alterações do tecido político e social do país, numa
região devastada pela sucessão de terríveis desastres naturais:
epidemias de cólera, terremotos, inundações, erupções do Etna, além
daquela constante e vasta calamidade que é a miséria dos deserdados.
Embora
ele tenha sido criado no conforto de uma família aristocrática e
rica, fez da pobreza, vivida em função do serviço e doação aos
outros, uma escolha programática da vida tão radical que, em sua
morte, nem mesmo um lençol foi encontrado: literalmente, ele se
despojou de tudo para cobrir seus pobres, dos quais ele se sentia um
humilde servo.
Seu
trabalho como serviço à Ordem Beneditina, à qual ele pertencia,
também foi de grande importância. Por mandato especial do Sumo
Pontífice Leão XIII, realizou-se a refundação do Colégio
Internacional de Santo Anselmo no Aventino - realizado há
exactamente um século - e a estruturação daquela Confederação da
Ordem de São Bento, hoje representada nesta praça por mais de 200
abades beneditinos, reunidos de todo o mundo.
O
Cardeal Dusmet, decoro e glória do monaquismo, do episcopado e do
Sagrado Colégio dos Cardeais nos transmite a mensagem profética de
autêntica solidariedade evangélica e dócil e activa fidelidade ao
carisma da própria vocação, vivida e expressa na realidade activa do
homem, dom total de si mesmo no itinerário traçado pelas pegadas de
Cristo Salvador.
Papa
João Paulo II – 25 de Setembro de 1988 – Homilia de Beatificação
José, Maria, Tiago,
Felipe, Domingos António, Rosalino, Belchior, Francisco de Paula,
Bento, Januário Dusmet (chamado na família de Belchior), nasceu em
Palermo, em 15 de Agosto de 1818, filho de Luís Dusmet, Barão de
Smours e Mararia Dragonetti, de nobre família, que também tinha dado
à Igreja um papa. Crescendo no exemplo de sua mãe, uma mulher de
grande caridade e do pai, honesto e piedoso católico, o pequeno
Belchior, desde criança, mostrou um predilecção particular para os
pobres e, secretamente, da janela da cozinha, oferecia aos muitos
necessitados que estavam à espera de caridade sob a casa dos Dusmet,
o pão que ele podia encontrar.
Aos 5 anos, como era
costume da época, o pequeno Melchior foi levado, como um oblato,
para Abadia dos Padres Beneditinos, onde os tios maternos já
viviam. Lá, sempre obediente e atento à voz do Senhor, Melchior
completou seus estudos, até que, tendo atingido sua juventude, seu
pai o chamou de volta para casar-se com alguma moça nobre.
Assim, o jovem bonito foi
levado para as festas e recepções mais importantes em Nápoles e ele
participou das melhores festas que uma nobre família poderia
desejar. Mas seu coração batia apenas pelo Senhor, e nada e ninguém
poderia dissuadi-lo daquele desejo ardente que ardia em seu coração.
Então ele voltou para a
Abadia de San Martino e aos 22 anos ele proferiu seus votos
monásticos tomando o nome de José Bento, e, apenas dois anos depois
foi ordenado sacerdote.
Na abadia, o jovem monge
era apreciado tanto por suas habilidades administrativas, por sua
inteligência, e por sua profunda espiritualidade, tanto que o novo
abade Dom Carlo Antonio Buglio o queria como seu secretário e o
tinha quase como um filho.
Em 1847 o jovem Dusmet foi
para a Abadia de Santa Flavia em Caltanissetta, como secretário do
Abade, onde a fama de suas virtudes se espalhou imediatamente e o
primeiro bispo da diocese nascente, Dom Antonino Maria Stromillo,
foi muitas vezes ao Monte das Cruzes, onde ficava a Abadia, para
pedir conselhos e ajuda espiritual ao padre José Bento.
O Capítulo de 1852
designou o Padre José Bento com o título de Prior Administrador, com
a função de abade, para que ele pudesse ajudar o bispo na difícil
gestão da diocese recém-nascida, mantendo-se fiel à Regra de São
Bento.
Enquanto o Padre José
Bento ajudava o bispo e fazia o seu melhor para a restauração
espiritual e material da Abadia de Santa Flávia, em 1854, eclodiu
uma violenta epidemia de cólera na cidade, que não poupou ninguém,
tanto os pobres como os ricos. O jovem Prior não hesitou e, todos os
dias, auxiliado também pelos sacerdotes seculares, foi acalmar os
sofrimentos dos doentes, trazendo-lhes alívio no corpo e no espírito
e conseguindo levar até os corações mais duros ao Senhor.
Em 1858 Mons. Stromillo
morreu, auxiliado pelo santo prior, e em maio, o Capítulo
transferido Dusmet para a Abadia de San Niccolò a Arena em Catania
com o título de abade. Ali também a comunidade necessitava de uma
reforma interna e, Dusmet conseguiu trazer todos de volta à ordem,
com paciência paterna.
Em 1866, no entanto, a
ordem estatal de evacuar o Monastério chegou, seguindo as leis da
Supressão das Ordens Monásticas e também o Dusmet foi forçado a
deixar a Abadia. O beato Papa Pio IX, temendo perder um tão grande
pastor da Igreja, como era o Dusmet, nomeou-o arcebispo de Catânia
(a sede estava vaga desde 1861); portanto, Dusmet deixou o cajado de
abade e tomou o cajado episcopal. Pediu, porém, e obteve do Santo
Padre, para reconstituir a comunidade monástica no Episcopado,
mantendo assim o título de Abade.
Apenas ordenado na
Basílica de São Paulo Fora dos Muros, em Roma, em 10 de março de
1867, ele enviou uma carta ao povo de Catania, na qual traçou o
programa de seu episcopado, entre a reforma do presbitério, o
aumento da fé, a fidelidade ao Romano Pontífice. Nunca deixou de dar
um lugar importante àquela virtude que sempre reinou suprema em seu
coração: a Caridade. Assim, dirigindo-se ao seu rebanho, escreveu:
Assim que tivermos um
pedaço de pão, compartilharemos com os pobres. Uma porta para cada
pobre que sofre sempre estará sempre aberta. O horário de
atendimento do episcopado dará de preferência para que os indigentes
entrem em todas as horas. Um alívio, e se faltarem os meios, um
conforto, uma palavra de afecto para todos e sempre.
Estas palavras são um
resumo de seu longo e frutífero episcopado, embora nem todo o seu
trabalho possa ser reduzido à caridade.
O Arcebispo Dusmet levou a
sério a saúde espiritual de seu povo e promoveu numerosas
iniciativas com fervor ardente, começando pela educação e
fortalecimento espiritual do clero, as quais ele então proveu com
ações catequéticas e pastorais verdadeiramente originais para a
edificação de fiéis, sensibilizando os corações do povo de Catânia e
acostumando-os a práticas reparadoras, como a exposição do
Santíssimo Sacramento.
Presente pessoalmente para
ajudar, cuidar e consolar entre as grandes calamidades que atingiram
a Arquidiocese nos 27 anos de seu episcopado, ele deu o mais belo
exemplo de intensa actividade apostólica.
Particularmente por sua
incomparável caridade, o Sumo Pontífice Leão XIII o nomeou Cardeal
em 1889. O retorno a Catânia foi um verdadeiro triunfo, embora o
Cardeal Dusmet desprezasse as manifestações solenes, desta vez era
impossível conter as pessoas que reconheciam naquele barrete
vermelho concedido pelo Papa o mais belo obrigado por aquele
abençoado Pastor.
O Cardeal Dusmet foi
atingido por uma doença e em 15 de Fevereiro de 1894, na reunião
mensal do clero, quase prevendo o seu quase desaparecimento, ele
conclui seu discurso com uma oração: "Aceita Senhor, o resto
dos meus dias". Essa foi a sua última saída, as condições de
saúde continuaram a piorar, despertando a atenção de toda
Arquidiocese, da Sicília e do mundo inteiro.
No dia 4 de Abril, às
22h30, entregou serenamente a alma a Deus, pronunciando com o Cristo
Crucificado: "Tudo está consumado".
A notícia se espalhou
rapidamente, de todos os lugares vieram mensagens de condolências,
oração e admiração, mesmo daqueles que em princípio lutavam contra a
Igreja.
Em 25 de Setembro de 1988,
na Praça de São Pedro João Paulo II proclamou Beato o Cardeal
Dusmet, depois da cura milagrosa do pedreiro Salvatore Consoli. |