Boxers ou Pugilistas foi o nome dado por um jornal inglês da China
aos membros da associação revolucionária secreta «Punhos da Justiça
e da Concórdia»: chamaram-se deste modo por causa do seu
exercício
diário de ginástica, reforçadora das almas. (Ver também, 8 de Julho,
Beatos Gregório Grassi e 28 companheiros).
O anti-estrangeirismo dos Boxers revelou-se desde 1898. Em 1900,
subiam a 741.562 os católicos chineses; e Leão XIII beatificara 19
mártires do Celeste Império. Dando-se profunda crise política,
económica e administrativa, agravada em 1900 com a fome, e
aumentando o descontentamento do «povo da cabeleira negra», devido à
penetração da influência política e do capital estrangeiro, entraram
em acção explosiva os Boxers. A missão jesuítica, mais tarde chamada
de Sien-Hsien, foi a primeira a ser atacada pelos Boxers.
Começaram por limitar-se a molestar os cristãos. Mas perante a
deslocação de tropas das 8 nações aliadas (europeias e
norte-americanas) destinada a proteger os seus súbditos e
embaixadores, a luta dos Boxers estendeu-se a tudo o que fosse
estrangeiro. São saqueados em Pequim os bairros europeus e cristãos.
É declarada guerra às sobreditas nações aliadas, que felizmente não
se generalizou. Mas no Shansi houve chacina de centenas de
católicos. A paz só foi assinada em Setembro de 1901.
Entretanto, a Igreja Católica contara em 1900, martirizados pelos
Boxers e pela organização feminina paralela, 5 bispos, 29 sacerdotes
europeus, 9 irmãs europeias, 3 irmãos auxiliares, e 20.000 a 30.000
católicos chineses. O processo informativo na Congregação romana,
então chamada dos Ritos, a respeito de 2055 destes heróis da fé,
terminou em Agosto de 1930, tendo já Pio XII beatificado, entre
eles, 4 padres franceses e 52 fiéis (3 dos quais catecúmenos). As
florescentes missões protestantes honram-se, nessa altura, também
com grande número de mártires.
Muito brevemente, vamos apresentar alguns dos 56 sobreditos
mártires:
Em V-i, na tarde de 19 de Junho de 1900, foram mortos na capela da
residência os Padres jesuítas Modesto Andlauer e Remígio Isoré.
Em Tchou-kia-ho, os Boxers e tropas regulares chinesas penetraram na
aldeia e depois na igreja, a 20 de Julho de 1900. Encontraram esta
cheia de fiéis presididos por dois padres da Companhia de Jesus,
acompanhados por catequistas. Depois de convites ao povo para que
evitasse a morte saindo do templo, o Padre Paulo Denn entoou a
Confissão em chinês, a que todos se associaram. Já tinha havido um
disparo geral contra a multidão. Em seguida, foram alvejados os dois
Padres que se encontravam em frente do altar. O Padre Denn ainda
conseguiu levantar-se e pôs-se de joelhos diante do Superior, Inácio
Mangin, para lhe pedir uma última absolvição; caiu à segunda
descarga. E o P. Mangin, estando ajoelhado diante da cruz e movendo
ainda os lábios, foi atingido por um segundo projéctil. Os Boxers
lançaram depois contra os cristãos palha a arder, o que motivou um
incêndio do tecto da igreja, enchendo-se tudo de chamas e fumo.
Entre os que puderam escapar-se da igreja em chamas, contava-se um
rapaz de 19 anos; Pedro Tchou- Yeu-sinn. Um general apertou-lhe
paternalmente os pulsos e insistiu muito para que renegasse a fé.
Mas o rapaz acabou por dizer: «Grande homem, não podeis renegar o
vosso pai nem a vossa mãe. Também eu não posso renegar o meu Deus».
Então, o oficial, aborrecido, exclamou: «Vai-te daqui, estúpido, que
não és outra coisa». E mandou decapitá-lo.
Em Ma-kia-tchoang, a 21 de
Julho, bastava aos cristãos entrar na casa onde estavam os soldados
para serem julgados apóstatas da fé cristã. Ana Wang, de 14 anos,
insistiu com a mãe e sobretudo com a madrasta para que não se
expusessem voluntariamente; mas não conseguiu, nem duma nem doutra,
o que tanto desejava. A noite foi de oração para os fiéis
perseverantes, oração sempre dirigida, aliás, por Ana; estavam todos
virados para Weits-unn, onde estava o sacrário. No dia seguinte
foram, com uma multidão de pagãos, para o local onde haviam de ser
mortos.
Quando, sobrevindo em 1901 a
paz religiosa, se quis desenterrar os cadáveres das vítimas, os
olhares da grande multidão reunida puderam ver, sem que tivessem
apodrecido, os membros e as cabeças dos mártires. Os pagãos gritaram
«Milagre, milagre!», ao mesmo tempo que os cristãos choravam de
alegria.
Marcos Ki, de 60 anos,
descendente de antiga família cristã convertida em 1650, médico,
administrador da cristandadezinha de Yet-tcheang-t'eu, fumava nada
menos que ópio, e tinha-se resignado a sofrer a sua escravidão do
maldito yinn (tirania do ópio). Resistiu, caiu, voltou a resistir,
recaiu muitas vezes, até que o yinn o dominou. O missionário, no
princípio, absolvera-o repetidamente; mas, por último, sendo grave o
escândalo, proibiu-lhe receber a Sagrada Comunhão.
Este comportamento, que se
diria paradoxal, durou 30 anos:
depois, o Senhor tomou-lhe a palavra. Na manhã de 7 de Julho de
1900, cerca de 200 Boxers entraram pela aldeia. Marcos e os seus, 13
pessoas, refugiaram-se num cemitério. Mas foram traídos e levados
presos. Incitado por amigos a apostatar para defender a vida e os
seus, respondeu: «Somos cristãos há dois séculos. O nosso
Cristianismo vai tão longe como a dinastia Ming; preferimos a morte
à apostasia; não podemos renegar a nossa fé». A resposta da
autoridade consistiu numa folha vermelha com a sentença: «Estes
pronunciaram palavras de soberba; sejam portanto levados à porta
principal e decapitados».
Num dos carros que os transportavam, o neto de oito anos, Francisco,
pergunta a Marcos: «Para onde nos levam, avô?» O velho apontou para
o céu e respondeu: «Voltamos a casa, meu menino!». E pôs-se a entoar
as invocações da ladainha mariana, a que todos respondiam: «Rogai
por nós».
Chegados ao lugar do suplício, Marcos disse aos seus: «Meus filhos,
não temais! O paraíso está aberto e próximo!». Seguindo-se novo
convite de apostasia, Marcos respondeu por todos: - «É inútil voltar
à nossa decisão; queremos todos subir ao paraíso!». Depois pediu,
como favor único, ser decapitado em último lugar; queria estar certo
de que nenhum tinha faltado ao reencontro no além.
Quando os espectadores viram que até as crianças (desde os quatro
anos) estendiam serenamente o pescoço ao fio da espada, disseram
entre si: «Com certeza devem ter bebido!». Terminada a execução,
foram-se embora os Boxers. E abriram-se três fossos: dois para os
corpos e um para as cabeças cortadas.
Paulo, que fugiu do cemitério, asseverava que todas as noites, na
hora da oração, invocava com todos os seus a intercessão dos seus
mártires de família, sobretudo de Marcos, seu pai e chefe dos Kis
cristãos.
O que muito resumidamente dissemos é a prova mais enérgica das
palavras do bispo Lécroart: «Quando o mundo conhecer a história dos
mártires da Boxe, ficará pasmado vendo assim renovada a história da
Igreja primitiva».
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