A sua
vida não se distingue por obras estrepitosas, mas antes pela
simplicidade e a fidelidade que punha em tudo o que fazia. Dele se
pode dizer que foi em primeiro lugar um “homem de Deus”, imbuído de
seu
Espírito.
Era um frade esmoler e por isso andava todo o dia entre o povo. A
sua posição não era a do poder, mas a de quem pede e deixa livre
quem está à sua frente. Ele pedia a esmola para o sustento dos
frades, deixava em troca a quem lhe dava, a serenidade, a paz, os
dons do Espírito.
O
serviço de esmoler, como o fazia frei Leopoldo, desapareceu de todo,
ou quase, na Ordem, mas é necessário descobrir outras formas para
estar presente entre o povo como "menores". "Submissos a todos os
homens deste mundo", reza São Francisco no Elogio das virtudes, para
oferecer a ocasião de cumprir um gesto de partilha e oferecer a eles
"a Sua paz", aquela paz do Senhor Jesus. Como? Envolvendo-os nas
obras de caridade que muitos de nossos confrades iniciaram,
pedindo-lhes que dediquem um pouco de seu tempo ao fazer e ao
receber o bem. Da gratuidade no doar-se só pode nascer o
agradecimento por aquilo que se recebeu.
O beato
Leopoldo faz parte dessa grande fileira de frades mendicantes que
encarnaram na minoridade a pergunta de quem procura, a pergunta pelo
Bom Deus que busca o homem porque lhe quer bem. Hoje o humilde
mendicante chega à glória dos altares, alegramo-nos e ao mesmo tempo
peçamos-lhe que acompanhe quem busca a Deus, que nos acompanhe para
que como frades menores capuchinhos saibamos estar abertos à voz do
Espírito para viver entre o povo na simplicidade, sem nada mais do
que o júbilo e a alegria de saber-nos amados por Ele.
No
centro da Serra de Ronda encontra-se Alpandeire, vilarejo minúsculo,
escondido, como um ninho no coração da montanha, uma beleza natural.
É a terra natal de nosso santo esmoler capuchinho, místico da
humildade e do ocultamento, dom de Deus à humanidade que procura o
seu destino.
Seus
pais, Diego Márquez Ayala e Jerónima Sánchez Jiménez, eram
agricultores, simples e laboriosos e, como a maior parte do povo,
trabalhavam duro para tornar fértil aquela terra rochosa da qual
deviam tirar o sustento para a família. Em 24 de Junho 1864 nasceu o
primeiro filho, que no dia 29 de Junho na pia baptismal recebia o
nome de Francisco Tomás de São João Batista, o nosso frei Leopoldo.
Diego e Jerónima tiveram a alegria do nascimento de outros três
filhos, Diego, Juan Miguel e Maria Teresa.
No
calor do amor familiar, alimentado pela prática das virtudes
cristãs, cresceu a boa semente cristã de Francisco Tomás. De seu pai
aprendeu as boas maneiras, os princípios cristãos e a prática do
bem. Dos lábios da mãe, aprendeu a oração. Alegre, ajuizado, de boa
companhia, trabalhador incansável, Francisco Tomás começava sua
jornada assistindo à santa missa e visitando o Santíssimo
Sacramento. Seu hábito de partilhar o pouco que tinha e a sua
bondade natural, jamais forçada, eram expressão de uma profunda vida
espiritual e de uma forte experiência de fé. Era "todo coração" no
socorro dos pobres, nos dizem as testemunhas que o conheceram.
Conta-se que dava suas ferramentas de agricultor a quem precisasse,
ou doava o dinheiro ganho com a vindima aos pobres que encontrava no
seu caminho voltando para casa.
Ele
viveu assim, no trabalho dos campos e na vida familiar, os seus
primeiros 35 anos de vida "escondida". Enquanto Deus o modelava
lentamente esperando a ocasião de chamá-lo para seu serviço. Em
1894, escutando a pregação dos capuchinhos por ocasião da festa que
se estava preparando em Ronda, para celebrar a beatificação do
capuchinho Diogo José de Cádis, o jovem Francisco Tomás, decide
abraçar a vida religiosa fazendo-se capuchinho. "Peço para ser
capuchinho como eles". Atraído por "sua vida retirada".
Só em
1899 ele foi acolhido entre os capuchinhos no convento de Sevilha.
Um mês depois foi admitido ao noviciado com o parecer mais do que
favorável, dos membros da comunidade que louvavam nele: o silêncio,
o empenho, a oração e a bondade. Pela mão de frei Diego de
Valencina, Superior e Mestre dos noviços, em 16 de Novembro do mesmo
ano recebeu o hábito capuchinho e o nome de frei Leopoldo de
Alpandeire.
A
decisão de fazer-se capuchinho não exigiu dele uma mudança radical
de vida, pois já vivia uma profunda e intensa vida evangélica. Frei
Leopoldo trabalhando no campo e na horta do convento transformava o
seu humilde trabalho em oração constante e em generoso serviço. A
mudança de nome, comentará anos mais tarde, o abalou "como uma ducha
de água fria", inclusive porque aquele nome não era usual entre os
membros da Ordem. A sua entrada no convento não era consequência da
pobreza, nem refúgio para um coração angustiado, mas a manifestação
do que já vivia e sentia vivo. O exemplo do beato Diogo José de
Cádis o tinha induzido a servir a Deus com todo o seu ser, até à
imolação.
Sabendo
que ele era agricultor, em Sevilha encarregaram-no de ajudar o irmão
hortelão. Na horta além de verduras frei Leopoldo cultivava também
seus dons espirituais. Quem o conheceu afirma que a sua santa
alegria correspondia à sua profunda interioridade que os seus olhos
e o seu rosto não podiam esconder. Qualquer gesto dele, mesmo o mais
corriqueiro e repetitivo, nascia de uma profunda comunhão com Deus.
O noviço frei Leopoldo experimentou a alegria de ter respondido ao
chamado de Deus. Uma coisa era certa: ele tinha 36 anos de idade,
porém sua juventude de espírito não era um facto somente interior,
irrompia visivelmente em sensível alegria. A experiência do
noviciado pôs as bases de seu caminho espiritual, pois o seu amor a
Deus ia crescendo mediante o conhecimento da tradição e da
espiritualidade da Ordem capuchinha.
Terminado o noviciado emitiu a primeira profissão, passando breves
períodos nos conventos de Sevilha, Granada e Antequera. A enxada
acompanhava-o constantemente, como uma fiel companheira, enquanto
cultivava a horta dos frades. Ele transformava em oração, o trabalho
manual e o serviço feito para os irmãos. Foi um "contemplativo entre
a água dos canais de irrigação, as hortaliças, os frutos e as flores
para o altar".
Frei
Leopoldo foi destinado ao convento de Granada, pela primeira vez em
1903, sempre no ofício de hortelão. Seus últimos anos foram vividos
em absoluto retiro entre os velhos muros conventuais e a horta.
Foram anos de profunda experiência espiritual e de silêncio. Na
horta cresceu o seu diálogo com Deus e nesse diálogo, as suas
virtudes. Da horta passava à capela do Santíssimo onde por longas
noites permanecia em profunda adoração. No velho convento de
Granada, no dia 23 de Novembro de 1903, frei Leopoldo emitiu os
votos perpétuos diante de frei Francisco de Mendieta, superior da
fraternidade. Era a sua consagração definitiva a Deus pela qual
tinha vivido e para a qual viverá o resto de sua vida.
Após
breve estadias em Sevilha e a Anteguera, em 21 de Fevereiro de 1914,
ele voltou a Granada onde permaneceu até o fim de seus dias. A
cidade aos pés da Serra Nevada, será o cenário de meio século de sua
vida. Hortelão, sacristão e pedinte, sempre unido a Deus e ao mesmo
tempo sempre próximo ao povo. O ofício de esmoler o definiu e o
caracterizou. Ele tinha-se tornado religioso para viver longe do
"barulho do mundo", foi lançado pela obediência a combater a batalha
decisiva de sua vida entre as ruas da cidade e o vozerio do povo. A
partir de então, com passo decidido, as montanhas, os vales, as
estradas poeirentas, as ruas, serão o seu claustro e a sua igreja.
Frei Leopoldo, como outros santos capuchinhos, com forte inclinação
à vida contemplativa, viveu constantemente em contacto com o povo e
isso em vez de distraí-lo, o ajudou a sair de si mesmo, a assumir o
peso dos outros, compreender, ajudar, servir e amar. Era, como disse
um fervoroso devoto seu: "separado, mas não distante".
A sua
figura foi tão popular na cidade que todos o reconheciam. Sobretudo
as crianças que ao vê-lo gritavam: “Olha, lá vem frei Nipordo”, e
corriam ao seu encontro. Ele parava explicando a elas, alguma página
do catecismo e com os adultos para escutar seus problemas e suas
preocupações. Frei Leopoldo tinha descoberto o modo de manifestar a
todos a bondade divina: recitar três ave-marias. Era a sua fórmula
de ligar o humano ao divino.
Por
meio século, dia após dia, frei Leopoldo percorreu Granada
distribuindo a esmola do amor, dando cor aos dias tristes de muitos,
criando unidade e harmonia, levando todos a encontrar Deus, dando
dignidade às acções de todos os dias. Todas as suas acções e seus
gestos para aproximar-se das pessoas, eram sempre novos.
Nem
tudo porém foi fácil, nem sem dificuldade. Frei Leopoldo exerceu seu
ofício de esmoler numa época em que na Espanha sopravam ventos
anticlericais e quem era religioso era mal visto se não perseguido.
Era o tempo das "Duas Espanhas", da Segunda República antes da
guerra civil e depois. Sete mil religiosos e sacerdotes foram mortos
só por serem da Igreja Católica. Na sua faina diária de esmoler frei
Leopoldo sofreu muito e não poucas vezes foi insultado: “Preguiçoso,
ainda te vamos enforcar com este teu cordão!”. “Vagabundo, vai
trabalhar em vez de andar pedindo esmola!”. “Prepara-te que vamos
cortar teu pescoço!”. “Experimentou este clima hostil e
parafraseando o Evangelho, dizia: “Pobrezinhos, só posso ter
compaixão deles pois não sabem o que dizem!”.
Será
que existia, pergunto-me, algum segredo na vida de nosso irmão
pedinte? Sim, o segredo de sua vida era a sua oração, a sua união
com Deus e o seu trabalho. Ele transformava tudo em oração e a sua
oração era o seu trabalho mais precioso. A sua vida não foi uma vida
de grandes gestos ou de eventos notáveis, a não ser o que
normalmente de pede a quem abraça a vida religiosa.
A
santidade de frei Leopoldo tinha como suporte a humanidade do velho
Francisco Tomás. Ele manteve a identidade do camponês de Alpandeire
que já incluía o seu caminho de santidade.
Frei
Pascoal Riwalski, Ministro Geral da Ordem, falando dele disse:
«Encontrando frei Leopoldo ficamos subitamente fascinados pelo seu
modo de ser simples, natural, sem artifícios, sincero e recto,
evangelicamente pobre. Um pobre que tem fé, cândido, simples e
discreto, que sempre soube pôr-se em segundo plano, servindo no
anonimato e na humildade. Um homem com um coração de menino, nobre e
franco, cortês e sóbrio, de camponês honesto... Um homem
extremamente reservado e modesto, quanto a tudo aquilo que de bom o
Senhor operava por meio dele, que se perturbava diante dos louvores
dos homens, que se alegrava com as humilhações e que mantinha uma
consciência viva de seus limites e de seus pecados. Frequentemente
repetia. “Sou um grande pecador!” A verdadeira centelha evangélica é
fruto da estima que temos por nossos semelhantes e pelas criaturas
na perspectiva de Deus. Frei Leopoldo conhecia bem o famoso dito de
São Francisco: “porque, quanto é o homem diante de Deus, tanto é e
não mais”» (Admoestações, XIX).
Não era
fácil ver os seus olhos. Frei Leopoldo, tomou como modelo São Félix
de Cantalício, em ter os olhos voltados para a terra e o coração
para o céu. Tinha olhos de criança, puros e penetrantes, serenos e
límpidos. Transmitia serenidade, pureza e doçura de coração, fruto
da paz interior que o invadia.
Ele tinha uma influência particular sobre todos aqueles que
encontrava por causa de sua humildade e disponibilidade. A sua
figura não era daquelas que impressionam e chamam a atenção. Mais do
que “andar entre o povo, frei Leopoldo, passava entre o povo”, mais
do que olhar, ele via no coração das pessoas que o cercavam.
Considerando a sua vida podemos dizer que ele aderiu ao Evangelho de
Cristo sine glossa seguindo o exemplo de São Francisco. O
extraordinário encontra-se na sua limpidez, clareza e silêncio. Num
clima de incerteza e falta de referências, a figura do Servo de Deus
frei Leopoldo apresenta-se como a de quem escutou com atenção a voz
de Deus e se deixou transformar na imagem do Filho Unigénito.
Um
certo dia, aos 89 anos de idade, enquanto recolhia, como de costume,
a esmola da caridade, ele caiu e fracturou o fémur. Foi levado ao
hospital, mas por sorte ficou curado sem operação cirúrgica.
Recebendo alta, ele retornou a pé ao convento, com a ajuda apenas de
seu bastão, mas não teve mais condição andar pelas estradas. Pôde
assim dedicar-se totalmente a Deus, o grande amor de sua vida.
Absorto em Deus, ele passou os últimos três anos de sua vida
consumindo-se pouco a pouco, “qual chama de amor”.
A
chamazinha se extinguiu em 9 de Fevereiro de 1956, quando ele tinha
92 anos de idade. O humilde esmoler das Três Ave-Marias, uniu-se
definitivamente ao Senhor. A notícia de sua morte correu por toda a
cidade de Granada, comovendo-a. Um rio de gente de todas as idades e
condições se dirigiu ao convento dos capuchinhos. A fama de
santidade que já o acompanhava em vida, cresceu após a sua morte.
Todo dia, mas sobretudo no dia 9 de cada mês, uma insólita afluência
de pessoas, de todo o mundo, visita a sua tumba. Muitas são as
graças que Deus concede por intercessão de seu servo fiel.
Bento
XVI no dia 15 de marco de 2008 declarou a heroicidade de suas
virtudes e no dia 12 de Setembro de 2010 foi declarado Beato.
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