Comentário pessoal...
Não é
certamente inútil lembrar que tudo quanto a Beata Alexandrina
escreveu no seu “Diário” (Sentimentos da alma) não se referia
unicamente ao tempo em que ela viveu, mas certamente e sobretudo aos
nossos tempos. Vejamos o porquê desta afirmação.
Primeiramente: Os escritos da beata só começaram a ser conhecidos
quando o Padre Mariano Pinho publicou os dois primeiros livros sobre
a sua dirigida (“Uma vítima da Eucaristia” e “No calvário de
Balasar”). Isto aconteceu nos fins dos anos 50 e princípio dos anos
60. Mas estas duas obras essenciais, apenas abordam alguns extractos
dos mesmos documentos, extractos escolhidos com muito cuidado, para
não “estorvarem” o processo canónico que em breve iria ser começado.
Segundamente: As comunicações sociais não eram as mesmas nem tinham
o mesmo impacto que aquelas que hoje conhecemos e utilizamos sem
restrições.
Em
1954, estávamos a uma dezena de anos do Concílio do Vaticano II e
das grandes modificações que iriam ser operadas na Igreja, não
porque o dito Concílio tenha sido um mal para a Igreja — penso-o
sinceramente — mas pela má aplicação que dele fizeram algumas
igrejas locais, aproveitando a situação para instaurarem
modificações contrárias aos princípios mesmo do Concílio e até mesmo
provocando algumas heresias que ainda hoje persistem, infelizmente,
nesses países.
Sabemos
que a Beata Alexandrina beneficiava de diversos carismas, entre os
quais o da profecia. Em 1945 descreveu com uma precisão
extraordinária o que se iria passar quase vinte anos mais tarde, no
que diz respeito à Sagrada Comunhão.
Em 19
de Novembro de 1954, recebeu de Jesus estas palavras:
— “Minha filha, minha filha, escuta o meu desabafo. O mundo peca
loucamente, dia e noite. Não cessa de desafiar a justiça de meu Pai,
mas os sacerdotes, tantos sacerdotes, aquelas almas a Mim
consagradas, tomam-me nas suas mãos, esmagam-me, põem-me todo em
sangue com os seus sacrilégios, vida de vícios. Os seus maus
exemplos abrem abismos para a perda de tantas, tantas, tantas almas.
Vigilância à Igreja, principie a Igreja. Haja uma renovação de
vida!”
Esta
“queixa” de Jesus não necessita de comentários, seriam quase
sobrerrealistas aqui.
Não se
trata nesta “nota” de criticar os sacerdotes pelos quais tenho o
maior respeito e um grande carinho, mas também não se pode dizer que
Jesus se enganou quando assim falou à Beata Alexandrina, tantos são
os casos que todos temos ainda presentes nas nossas mentes, visto
que há bem pouco foram abundantemente evocados pelos jornais e
televisões do mundo inteiro.
Dizer
que de todos os tempos assim foi, seria fácil como argumento. Não,
os tempos não foram todos como o nosso tempo, mesmo se estou
convencido que a história do mundo se desenrolou, até aos nossos
dias, em ciclos relativamente semelhantes uns aos outros. O nosso
tempo, porque é justamente o nosso, parece ser pior — e isto não é
pessimismo da minha parte! — do que qualquer outro, justamente
devido, ou graças, aos meios de comunicação actuais, que são
inimagináveis.
A Beata
Alexandrina confessa: “Não
posso dizer, não sei dizer em que estado vi o meu Jesus. Todo o Seu
ser era uma massa de sangue. Não tinha forma humana. Ai, como eu vi
o meu Jesus!... E como aquela massa dava sangue, só sangue!”
Certos
teólogos afirmam, com grande rompante, que Jesus deixou de sofrer
com a sua própria Ressurreição e a sua Glorificação junto do eterno
Pai. É verdade e não, porque Cristo continuará a sofrer até ao fim
dos tempos no seu Corpo místico que é a Igreja. O mesmo é dizer,
como disse São Paulo, que cada um de nós deve “sofrer no seu próprio
corpo, aquilo que faltou à Paixão de Cristo” e faltou porquê?
Simplesmente porque Jesus adicionou aos seus próprios sofrimentos,
todos aqueles pecados, ofensas e blasfémias que o fariam sofrer até
à consumação dos séculos. Isto não exclui de maneira nenhuma, todas
as orações, desagravos e ofertas que lhe seriam feitos durante esse
mesmo período, período no qual devemos incluir a Beata Alexandrina
que muito bem compreendeu esta maneira pela qual Deus tinha
escolhido para redimir o mundo. Por isso mesmo, a cada passo, em
qualquer ocasião ela exclama e grita mesmo, com uma fé inalterável:
—
Sou a Vossa vítima, sou a Vossa vítima. Sede Jesus, transformai-Vos
na beleza de Jesus.
Que
fazer?
Para
nós que fomos ou somos, prevenidos “a tempo”, uma solução se
apresenta, clara e nítida: orar. Se a nossa oração for sincera,
podemos “influenciar” o Coração do Pai, podemos abrandar o peso da
sua divina Justiça, porque Deus sendo Amor, está sempre pronto a
perdoar, se humildemente Lhe pedimos perdão pelos nossos pecados,
pelas nossas faltas de amor.
Mas,
quem tem pecados hoje?
Vivo há
mais de quarenta anos num país que baniu a palavra pecado, porque,
Deus sendo amor, perdoa tudo e mais alguma coisa. Por isso mesmo,
nem é necessário confessar-se diante dum sacerdote, porque Deus “vê
tudo, mesmo o que é secreto” e sabendo que pecámos, logo nos perdoa,
nem sendo mesmo necessário pedir-lhe perdão... Esta é uma das
heresias duma parte da Igreja de França.
No
momento da Comunhão, todos se levantam e todos estendem a mão para
receberem o Rei dos reis, para receberem o Deus único e verdadeiro.
Mas, quantos se confessaram e pediram perdão pelos pecados
cometidos? Quantos destes tiveram a coragem de ajoelhar diante dum
sacerdote — representante de Cristo na terra — e de lhe dizerem
humildemente: “Padre, perdoe-me porque pequei” e de confessar todos
os desaires que em cada dia cometemos contra o nosso Deus de amor?
Pessimista!
Não, de
maneira nenhuma e, dizer o contrário do que aqui afirmo, seria
mentir e tratar Deus de mentiroso.
São
João Paulo II disse muitas vezes que nesta época em que vivemos,
muitas vezes se confunde o bem com o mal e o mal com o bem; que
muitas vezes dizemos ser bem o que é mal e mal o que é bem.
Será
isto maledicência ou falta de caridade?
Penso
que não, pois dizer e explicar uma verdade que só os cegos
(voluntários) não vêem, só pode ser uma obra de misericórdia.
Somos
todos pecadores e eu, talvez o maior de todos, e todos queremos ser
salvos, participar na Mansão celeste da glória de Deus, por isso
mesmo devemos amar-nos uns aos outros e uns aos outros nos estimular
a viver a verdade de Deus e não a nossa verdade.
Então,
se assim é, sejamos suficientemente humildes para dizermos, para
gritarmos do fundo dos nossos corações, como a Beata Alexandrina de
Balasar:
—
Sou a Vossa vítima, sou a Vossa vítima. Sede Jesus, transformai-Vos
na beleza de Jesus.
Vem,
Senhor Jesus!
Afonso
Rocha |