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PONTOS DE REFLEXÃO
PRIMEIRA LEITURA Is66,10-14c
O Livro de Isaías - este
é o Terceiro Isaías, profeta pós-exílico
(caps. 56-66) - termina
com um alegre anúncio destinado à cidade
de Jerusalém: esta será restaurada e os judeus dispersos regressarão
a ela, depois do tempo do «luto» (v. 10b) que caracterizou
a dura experiência do exílio.
Compreende-se o convite repetido à
«alegria» e apromessa da
«consolação», (w. 10a-ll.13.14) Como noutros profetas, a cidade de Sião
é apresentada com imagens e simbologias maternas.
A palavra do profeta
consegue fazer-nos compreender fortes
sensações. Antes de mais,
descreve de modo vivo e somático um terno amor
entre mãe e filhos. A mãe é Jerusalém, a cidade das
prerrogativas simbolicamente
«maternas», capaz de oferecer vida,
alimento e protecção. Fala-se da sua
plena participação na «alegria»
dos filhos que voltam a abrigar-se dentro das suas muralhas
(v. 19), do acto de alimentar ao seu
«seio» os seus filhos (v. 11), de
serem levados «ao colo» como
«meninos» e de serem consolados
em Jerusalém (w. 12-13). Estes
filhos, ao invés, são um povo de sofredores, desalentados pelo castigo
de uma provação demasiado longa, que agora podem voltar a
festejar a mãe e são por ela retribuídos com múltiplas consolações.
A segunda
sensação que o profeta consegue comunicar-nos é um extraordinário e
consequente clima de alegria, para o qual recorre a uma vasta gama de
termos, rica de imagens singulares: «Alegrai-vos, exultai. Enchei-vos de
júbilo» (v. 10); «saciai-vos com o leite das suas consolações»; «podeis
deliciar-vos no seio da sua magnificência» (v. 11); «sereis levados ao
colo e acariciados sobre os joelhos» (v. 13b); «alegrar-se-á o vosso
coração, retomarão vigor os vossos membros.» (v. 14) Ê interessante
notar como por detrás destes desvelos maternos se revela a presença do
próprio Senhor, o qual cuida do seu Povo: «Como a mãe que anima o seu
filho, também Eu vos confortarei.» (v. 13a) É o próprio Deus que dá bons
sentimentos à mãe e consola os filhos.
SEGUNDA LEITURA
Gl 6,14-18
A conclusão
da Carta aos Gálatas, que Paulo afirma ter escrito de seu próprio punho
(cf. Gl 6,11), sintetiza os motivos preponderantes de todo o escrito. O
Apóstolo recorda de modo incon
testável o âmago do Evangelho: é discípulo de Cristo aquele que
colocou no centro da sua própria vida a Cruz de Jesus. Só gerados
e alimentados por essa fonte é que
poderemos «ser novas criaturas».
(v. 15) No que lhe diz respeito, Paulo declara que no centro
da sua «glória» não está a observância rigorosa da Lei, mas Cristo
crucificado (v. 14).
O que Paulo tinha pedido,
na Carta que lhes enviou, aos cristãos da
Galácia, que se tinham deixado seduzir por uma religiosidade
tradicionalista, não diz respeito a uma simples renúncia a deixarem-se
circuncidar: seria demasiado redutivo! Pelo contrá-rio, exortou-os a
quererem compreender a novidade criada neles pela morte de Cristo na
Cruz: eles começaram a participar numa
«nova criação»; tornaram-se o «Israel
de Deus» (v. 16b); um povo
completamente original. Se isto é verdade, então já não conta estar
ou não circuncidado, mas só «ser nova criatura» (v. 15), mediante o dom
gratuito da Cruz. Este é o princípio da vida cristã.
Acolhido na fé, assegura a «paz» e a «misericórdia» de Deus (v.
16a).
Paulo acreditou tanto
nisso que apostou a sua vida inteira nesta
certeza, até sentir-se crucificado com Cristo (cf. v. 14), trazendo
«no seu corpo» os
sinais de uma permuta existencial de participação
no mistério da Paixão de Jesus. A conformidade com a Cruz
marcou o seu próprio
corpo, como testemunham os «estigmas» dos
sofrimentos provocados pelo seu ministério apaixonado (v. 17).
A saudação final, que
invoca a «graça» de Cristo sobre os «irmãos» (v.
18), revela as intenções de comunhão que guiaram o
Apóstolo, mesmo quando o debate com
os Gálatas assumira tons polémicos.
EVANGELHO
Lc 10,1-12.17-20
Só Lucas
nos apresenta a «missão» dos setenta e dois discípulos, depois de ter
descrito um pouco antes a «missão» dos Doze (cf. Lc 9,1-6). O número
«setenta e dois», que alude ao número das nações pagãs segundo a
tradição de Gn 10, juntamente com a expressão «todas as cidades e
lugares» (v. 1), prefigura a missão universal da Igreja. A mensagem do
missionário cristão, depois, decalca fielmente a da pregação de Jesus,
quer no tocante à proximidade do «Reino de Deus» quer ao juízo, evocado
pelos temas da seara (w. 2,9), quer pela derrota de Satanás (w. 10-12).
A
actividade missionária de todos os tempos está bem definida por Jesus
neste pequeno compêndio, que lhe ilustra a origem e a finalidade,
esclarece as respon-sabilidades dos enviados e dos destinatários e
descreve as modalidades.
Não nos
surpreende ouvir da boca do Mestre que a missão não é fruto de decisões
ou de empenhos humanos. O primeiro responsável é o Pai, «dono da seara»
(v. 2): a Ele cabe a salvação dos homens, é Ele que suscita os
anunciadores do Reino. Por isso o missionário é sereno e corajoso no
anúncio, actua na confiança e na ausência total de seguranças ou de
recursos materiais, não se deixa tentar pelo fascínio da imposição
forçada, não impressiona o auditório com meios poderosos ou efeitos
especiais, está consciente de que a fecundidade da missão está toda na
força inerme da Palavra de que é arauto, uma Palavra capaz de curar e
libertar de todas as enfermidades.
Enviados
«dois a dois» (v. 1), como «cordeiros para o meio de lobos» (v. 3), os
missionários testemunham uma comunidade vivida, e aonde quer que cheguem
criam comunhão (w. 7-8). A qualquer casa ou cidade, ou seja, nos locais
da vida privada ou nos da vida pública, eles devem levar a «paz» do
Reino (w. 5-6), experimentando o poder do Nome de Jesus sobre as forças
do mal(c£v. 9).
São
inaceitáveis os compromissos, mas mesmo perante a rejeição o missionário
não deve cessar de repetir com confiança: «Ficai sabendo: Está perto o
reino de Deus.» (Cf. w. 10-12)
P. José Granja,
beneditino |