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SENTIMENTOS DA ALMA

1951

JANEIRO

5 de Janeiro de 1951 – Sexta-feira

As minhas alegrias na minha morte.

Recebi dois grandes mimos de Jesus. Um veio-me pelo meu Pai espiritual, e outro pelo nosso santo cardeal. Foram palavras dum e doutro que deviam ser para mim motivo de grande alegria, mas caíram na minha morte e também morreram sem eu as poder saborear.

Oh, se ao menos fossem para os Corações Divinos de Jesus e da Mãezinha aquelas alegrias que deviam alegrar e satisfazer o meu pobre coração!

Para mim, saber Jesus consolado e satisfeito era tudo. Que Ele me aceite estes indizíveis desejos e me dê como recompensa a coragem, a alegria na minha cruz, o conforto nesta noite tremenda de morte pavorosa de todo o meu viver.

São os meus olhos que falam quando fito a Jesus ou a Mãezinha, ou quando os levanto ou fito no Céu. É este coração morto que se abre para mostrar ao Senhor o quanto sofre e mesmo assim quanto o desejo amar. Só o Céu, só Jesus podem e sabem dizer como é doloroso o meu calvário e como é triste a minha passagem aqui pela terra.

Sorrio a tudo por amor de Jesus e por Ele e n`Ele tudo é alegre e tem doçura. Mas em tudo e por tudo o coração sangra. Sorriem os lábios e choram os olhos da alma. E não sei porquê, a minha ignorância não me deixa saber nem dizer por que é que tanto custa sofrer e eu tanto quero sofrer e não posso nem sei viver sem sofrer. Vivo e não vivo, não vivo para nada, vivo para fazer a santa vontade do Senhor.

A minha alma nestes dias não deixou de sentir nela um cingido e pesadíssimo capacete de espinhos. Não tenho nela o mínimo bocadinho que não seja por eles trespassado. O mesmo sucedeu ao coração. Foi sempre ferido e sempre esteve cingido de espinhos e atravessado por punhais e lanças. Meu Deus, como eu sofri em todo o meu corpo! Todo o meu ser foi massa de sangue desfeito que os espinhos atravessaram. Sofri em silêncio com Jesus; só com Ele e com a Mãezinha desabafei. Não tenho forças para nada. Tenho que obedecer, Jesus quer que eu obedeça. É tal o meu estado que me parece aborrecer-me de Jesus e querer-me libertar d`Ele. Mas não é assim: quero só o que Ele quer e dar-Lhe aquilo que Ele de mim espera.

Ontem, quando o meu coração e a minha alma foram transportados ao Horto, parecia-me que levavam consigo o mundo. Que doloroso, que difícil! Caiu sobre mim o peso da justiça divina; a alma agonizou, o corpo suou sangue. A noite foi de martírio contínuo. Não se compreende como se possa sofrer tanto. Só quem sofre sabe, só Jesus o conhece.

Hoje segui para o calvário; segui e fugi dele, eu fui a autora dele e ao mesmo tempo só eu O podia lavar com o meu sangue, lavá-lo e dar-lhe vida. O meu coração ardia de amor. Abracei-me à cruz. Tinha em mim uns olhares enternecidos que se compadeciam do mundo inteiro. Em tanta dor, não deixava de amar. O coração ardia e eu cheia de dó e compaixão. Oh, não era eu, era Jesus cheio de bondade, era Ele, bem o senti: sofria, amava e dava a vida. Veio a morte, separou-O de mim. Durou bem pouco tempo esta separação. Ele foi e veio e foi quase como se ficasse. Chamou-me ao mesmo tempo que batia à porta do meu coração:

— Minha filha, sabes quem bate? Sabes quem te chama? É Jesus que quer entrar.

Minha filha, sabes o que quer este Jesus? Quer entrar e ser sempre o hóspede do teu coração. Quer entrar e quer ser mendigo. Eu não quero ser hóspede e reinar no teu coração para que sintas consolações, para que experimentes as doçuras inefáveis do meu amor, pois essas senti-las-ás muito em breve no Céu, na tua Pátria que te espera. Quero entrar e ser hóspede no teu coração para consolar o Meu e deliciar-Me no fogo ardente do teu amor. Eu quero, minha filha, ser mendigo, e isso vou já fazê-lo: sofre, sofre minha filha, com alegria, com heroísmo. Repara o meu divino Coração, repara a justiça divina tão ultrajada. Ai, o mundo tão criminoso que está perdido! -

Quando Jesus falava, vi no Seu santíssimo rosto e nos braços salientarem-se tanto as veias, rasgarem-se dum lado ao outro e romperem em sangue. Jesus estava aflitíssimo e as lágrimas rolavam-lhe pela sagrada face.

Ó Jesus, Ó Jesus, ponde termo ao Vosso sofrer e não o ponhais ao meu. Perdoai e pedi ao Eterno pai misericórdia para o mundo e para Portugal.

— O mundo! Fiz tudo por ele, dei todo o sangue e a vida! Pus nele as minhas vítimas, desprezou os seus sofrimentos; convidei-o à reconciliação, não quis reconciliar-se, não quis ouvir-me.

Portugal, Portugal! O que seria de Portugal, depois de minha Bendita Mãe, senão fossem as vítimas, a grande vítima, o pára-raios deste calvário?!

Portugal ingrato, que não quis atender ao apelo de minha Bendita Mãe” -

Perdoai, Jesus, perdoai agora, perdoai sempre. Deixai-me, Jesus, ir ao Vosso Divino Coração buscar ao Vosso amor bálsamo para as Vossas lágrimas e para as Vossas feridas.

— Vem, minha filha, receber a gota do meu Divino Sangue. Vai, corajosa e alegre para a tua cruz com esta vida que de Mim recebes. Não temas, que não te enganas. Tens graça que transparece, tens em ti a ciência e a sabedoria divina. Sê sempre generosa, sê sempre o jardim formoso de Jesus, para que dele rompam aromas celestes que atraiam a Mim as almas. Coragem, vai em paz e dá a todos o meu amor. -

Obrigada, obrigada, meu Jesus.

6 de Janeiro de 1951 – 1º Sábado

Estou já na noite do dia 7, quando já tudo está em silêncio, a ver se consigo fazer o que ontem queria ter feito. Só poderei ditar se Jesus me der forças. Oh, como eu me sinto desfalecida, depois de um dia cheio de tantos e tão grandes sofrimentos para a alma e para o corpo. Que tristes recordações!

Faz hoje nove anos que eu aqui tive a celebrar Missa e a ouvir-me de confissão o meu Pai espiritual. Nesse mesmo dia recebeu a proibição de voltar junto de mim. Quantos sofrimentos e angústias surgiram desde esse dia!

Ó meu Deus, tudo por Vosso amor. Por Vós, tudo é alegre, nada é amargo.

Ontem de manhã, tive pela segunda vez a Santa Missa celebrada pelo filho do meu bondoso médico. Rodeavam-me várias pessoas do número das mais queridas. Sentia-me a mais pobre e indigna entre todas. Sempre sem saber assistir ao Santo Sacrifício, pedi como de costume à Mãezinha que assistisse Ela por mim com a Sua sabedoria, sentimentos e amor. Eu era um cadáver em sepulcro e tudo quanto se ia passando ia-se sepultando comigo. Meu Deus, tremendo martírio! Chegou o momento da Sagrada Comunhão, Jesus deu entrada no meu coração, transformou-mo, fiquei logo outra, mais forte e iluminada por uma nova luz. Ouvi a voz doce e suave de Jesus que me dizia:

— Minha filha, sou Eu que estou aqui, fui Eu que dei entrada no tabernáculo do teu coração e meu paraíso de delícias.

Eu quero confortar-te, encher-te e animar-te para mais sofrimentos, para mais cruz. Sofre, alma heróica e generosa, sofre alegremente, nada negues ao teu Jesus. Eu quero agradecer-te o teu heroísmo, a tua generosidade, tudo quanto me tens dado. Quero agradecer também aos que contigo sofrem e te ajudam no mais doloroso calvário, esforçando por levar ao fim o triunfo da minha causa. Agradeço tudo, porque também Eu gosto que a Mim Me agradeçam. Este novo ano será na causa divina ano de luz e de glória para Mim. Não há rosas sem espinhos. Por entre elas eles hão-de sobressair, hão-de ferir-te e ferir os que por meu amor trabalham. Coragem, pois.

Diz, minha filha, ao teu Paizinho que os raios de luz dissiparam as nuvens e se estendem por todo o espaço. É Jesus a exaltar os humildes e a realizar as suas divinas promessas. Dá-lhe amor, todo o amor do meu Divino Coração.

Diz ao teu médico um “obrigada” de Jesus só para ele, pelo seu pronto e fiel auxílio à causa divina, à causa da missão mais sublime. Dá-lhe em meu nome uma chuva de graças e amor para ele e todos os seus entes queridos.

Vem, minha Bendita Mãe, não deixes sem o teu carinho a nossa filhinha. -

Veio a Mãezinha, ficou ao meu lado direito, beijou-me, acariciou-me, tomou-me para o meu regaço, cobriu-me com o seu manto azul bordado a ouro: era manto de Rainha.

— Minha filha, minha filha, se me queres agradar, faz sempre a vontade de Jesus, sofre tudo por Ele, pelo mundo, pelos pecadores, não os deixes ir para o inferno.

Ó minha filha, ai, o pobre mundo que não me atendeu a Mim nem atendeu a Jesus! Acode-lhe, acode-lhe, trá-lo sempre no teu coração, no teu entretenimento de amor, na tua passagem do Coração Divino de Jesus para o Meu e do Meu para o de Jesus, que tanto nos consola; leva-o sempre contigo para assim ele estar sempre nos Nossos Divinos Corações. Não esqueças que foi posto por Nós no teu coração e que a ti foi confiado. Aceita novamente este manto, todo sob este abrigo. -

A Mãezinha tirou dos seus santíssimos ombros o manto e colocou-o sobre os meus. Jesus ajudou. Nesta ocasião eu senti como se o mundo inteirinho estivesse à sombra daquele manto celeste. Num impulso de amor, bradei:

Ó Mãezinha, ó Mãezinha! Ó Jesus, ó Jesus, não o deixeis daqui sair; só assim será poupado, só assim não corre perigo. Perdão Jesus, perdão, Mãezinha.

— Vai em paz, esposa minha, vai forte para a cruz. Leva a todos os que te são queridos o amor de Jesus e da Mãezinha, e diz-lhes em nosso nome um obrigado celeste.

Coragem! Vai em paz!

Obrigada, Jesus; obrigada, Mãezinha!

12 de Janeiro de 1951 – Sexta-feira

Cá vou eu para o meu martírio inaudito. Por mim não tenho forças, nada posso. Com Jesus serei forte, direi o que Ele quiser. Num total abandono a Jesus e na Mãezinha, vou n`Eles e com Eles para onde Eles pararem. Estou no auge da minha dor e aflição. O meu coração e a minha alma têm sofrido e chorado tanto! Com frequência rompiam em gritos, pareciam saírem de dentro do meu íntimo e ecoarem e ouvirem-se aos meus ouvidos como se fossem vozes. Sinto o coração profundamente aberto: as lágrimas caem lá dentro quase constantemente. Por muitas vezes esta agonia e lágrimas interiores obrigavam-me a romperem-me dos olhos muitas lágrimas. A custo, com muito sacrifício, procurei encobri-las. Não sabia, a minha ignorância não me deixa, não sabe justificar a causa destas lágrimas. São lágrimas que brotam dum ser infinito; por isso, a dor e a agonia não são minhas, passam por mim, vêm e chegam ao infinito. Tudo isto é de Deus e vai para deus. Eu sou só morte, nada tenho que desse ou possa dar vida. Tenho medo do meu estado de alma, tenho medo de tudo. Tudo é pavor e tudo em mim e à volta de mim parece inferno, um mundo de infernos. Tudo são trevas, mas trevas que nunca souberam nem viram o que era luz. Mas a alma, não sei com que impulso rompe tudo isto. Rompe serena, só de longe a longe lá vai a lançar-se ao desespero, não pode mais; mas há alguém que lhe dá força e lhe faz sentir que pode. E ela lá vai, meu Deus, até que ponto? Aqui ela queria expandir-se, estender-se, dizer tudo, mas como este tudo morreu, aqui fica sem dizer mais nada. Ontem passei o dia pelo Horto, mas um Horto completamente mortal, mais mortal ainda, porque se juntava a morte do Horto e do Calvário à minha morte. As lágrimas e os gritos da minha alma eram pavorosíssimos. Eu queria-me sozinha e esconder-me a tudo e a todos. Neste momento, o meu corpo cobriu-se com um suor de sangue, ou melhor, senti como se cobrisse e este banhasse e ensopasse a terra.  A noite foi um calvário de sofrimento. E nesta manhã a alma para lá seguiu, mas rompeu sozinha, como que desorientada, sem Jesus, sem cruz. Foi como folha podre e seca que o vento arrastou. Quanto mais se aproximava o fim da montanha, mais difícil se tornou a subida; mais agonia, mais sangue, mais abandono e mais dor. Divisou no cimo a cruz, lá a esperava; tudo nela seria consumido. O coração ardia em fogo e formava como que um voo para à cruz se unir. No fim da dolorosa viagem ficou o coração no centro da cruz não crucificado, mas a ela unido, cercado de espinhos, atravessado pela lança e a servir de apoio à esponja. O sangue corria gota a gota, descia a cruz, ia regar a terra. Neste transe doloroso passaram-se as horas da agonia. Uniram-se por fim a este Coração as dores da Mãezinha e neste momento senti em mim a morte e como que a separação da alma. Passado algum tempo, nova transformação senti, parece que a alma ficava mais nova, com mais luz e vida. Jesus falou-me assim:

“Minha filha, o abandono do Calvário e da cruz é das almas verdadeiramente vítimas, é das almas loucas e apaixonadas da cruz. Tu és a louca da Eucaristia, louca por Jesus, louca pelas almas. Tem coragem, minha filha! Consolam-me mais os sofrimentos das almas vítimas num só dia do que todas as orações e mais obras do mundo inteiro. A humanidade sem vítimas era um jardim sem flores, era um cadáver sem vida, era uma vida sem luz. Tu és a vida desses cadáveres que o pecado matou, tu és o farol e jardim florido, és luz que brilha. Por ti as almas são enriquecidas, antes e depois da morte. Que chuva de graças”!

Ó meu Jesus, Vós sois o Senhor de toda a riqueza; só Vós podeis enriquecer, só a Vossa luz pode brilhar. Vede que pobrezinha ela sou. Quero para mim a esmola da Vossa graça e da Vossa força; sem ela, Jesus, não chego ao cimo do meu calvário. Eu caio, desespero e morro.

“Não cais, Minha filha, Jesus ampara-te; não desesperas, Jesus vela por ti; não morres de dor, tens em ti a vida divina. Estás no transe mais tremendo, na fase mais difícil que se pode imaginar. É sinal claríssimo da tua aproximação e união com Deus. Tal sofrimento só podia ser dado a uma alma fidelíssima e inteiramente heróica. Coragem, coragem, coragem! Brada sempre por Mim. Virei em pronto socorro. Continua a dar-me o martírio do teu coração, o martírio da tua alma e de todo o teu corpo, que é martírio de amor. Chora para que Eu não chore, sofre para que Eu não sofra, agoniza para que não agonizem as almas no inferno eternamente.”

Ó Jesus, se me ajudais estendo-Vos mais uma vez os braços com toda a aceitação do coração. Como nada Vos nego, nada me negueis também. Não deixeis que a guerra se espalhe mais pelo mundo, não permitais que ela venha a Portugal, e fazei que acabe nos lugares onde se combate. Perdão e misericórdia para nós todos, meu Jesus. De todos sou vítima, meu Amor.

“Vem louca, louca, receber a gota do meu Divino Sangue, a vida que é a tua vida. E dize que Jesus o disse: Eu não quero que se perca nem uma só faúlha que sai da chama tão ateadora, o teu estado de alma. Eu já de há muito o vinha prevenindo. Que nada deixem perder desta vida que é tão minha. Vai para a tua ignorância, nela está a minha sabedoria; vai para as tuas trevas que lá está a minha luz; vai para a tua cruz que é nela, só nela que está o meu amor. Coragem, coragem! Vai em paz”.

Obrigada, obrigada, meu Jesus!

19 de Janeiro de 1951 – Sexta-feira

Sou morte e piso terreno morto em mim e à volta de mim. Todas as coisas morrem e são sepultadas. O estado da minha alma é doloroso e por vezes insuportável. Brado logo ao Céu, chamo por Jesus e pela Mãezinha: Valei-me, Valei-me, porque não posso mais; valei-me, valei-me para não me verdes perdida eternamente. Este brado saído da minha morte, morre e é sepultado antes de ser ouvido. Fico apavorada. Tremo e parece comigo tremer a terra com tal morte, com tais trevas e com tal ignorância. Jesus e a Mãezinha não vêem com a Sua presença, mas mandam-me a Sua força e conforto; respiro mais libertada da dor, retomo coragem e noivas ânsias e nova sede mais amor e de mais dor me devora o coração. Abraço-me em espírito novamente à cruz e digo: Não te largarei jamais, quero-te e amo-te por Jesus, quero-te e amo-te pelas almas. Sinto o coração e o peito rasgado, e o coração não cabe em si, nem cabe dentro do peito, quer vir dar-se ao mundo, quer possuir o mundo. Não sei falar deste dar, nem deste possuir. Quer dar-se inteiramente e inteiramente possuir. Não quer viver sozinha, não pode viver sem viver entre os homens. Oh! Como é terno, doce e meigo este dar-se. Sei sentir, mas nada dizer. Oh! Como está faminto o meu coração! Parece-me que a minha vida é inútil no mundo. Jesus me perdoe, mas tive este desabafo. Como eu não vivo nem vivem a s minhas coisas e como eu me sinto a mim mesma, torna-se inútil todo o meu viver. É o que eu sinto e este faz-me ter medo de mim e de todos. Meu Deus, ai que tremendo abandono! Voltei a sentir novamente aquele pavor que tinha há anos com o aproximar-se a quinta e a sexta-feira. Este sofrimento tinha-me sido suavizado, embora sempre com muita dor. Mas agora, há tempos para cá, oh! que medo, meu Jesus! Nova morte sem ser a morte que em mim sinto eu diviso muito ao longe. Vem ao meu encontro e traz para mim todos os suplícios, todo o martírio. Ontem, quinta-feira, redobrou o tormento da minha alma. Este conjunto de mortes e a aproximação do Horto levaram-me a repetir muitas vezes no meu íntimo: a minha alma está triste até à morte. Eu envolvi-me na terra e a justiça divina esmagava-me contra a mesma terra do Horto. O sangue rompeu-me as veias; um suor dele me deixou banhada. Veio a prisão; fui entre os soldados sob uma chuva de maus-tratos para os tribunais. A alma e a noite passaram a noite e penoso martírio. De manhã, segui para o calvário. Durante a viagem, o meu coração falava só para ele, eram para dentro os meus desabafos. Os lábios iam mudos. O corpo despedaçado suava e vertia sangue. O coração ardia em amor e mais se ateavam as chamas quanto maior era a agonia, quanto mais fortes e repetidos eram os brados e quanto mais se aproximava o momento de dar a vida. Veio a morte, separei-me da cruz e de Jesus. Após algum tempo desta separação, ouvi a sua voz divina que me dizia:

“Ouvi quem fala, ouvi quem vos quer… É Jesus que é a vossa vida. Vinde a Mim todos. Chama-vos, quer-vos o meu Divino Coração. Vinde a Mim todos, amai-me, não pequeis mais. Depressa, depressa, este convite é de Jesus. Depressa, depressa, mais oração, mais penitência… depressa, depressa a renovar a vida e os costumes… depressa, depressa, filhos meus. Ai! Para quantos já é tarde este convite! Chamei, convidei, preveni a tempo… Quantos e quantos receberam a justiça de meu Pai… e porquê? Porque não atenderam à voz divina, ao convite do Céu. Já caiu a justiça e mais vai cair… Já milhões de pecadores foram castigados e mais milhões deles o vão ser”.

Ó Jesus porquê a Vossa pressa? É para serem poupados aos castigos os filhos Vossos? Dizei-me, meu Amor… Ainda nos livrais dos rigores da justiça divina, se todo o mundo fosse para Vós depressa e num impulso de amor?

Ó minha filha, ó minha filha, para que te coloquei Eu neste calvário? Foi para seres o porta-voz de Jesus nestes dias tão criminosos e tão ameaçadores. Por ti convidei o mundo. Por ti atendeu o meu Representante na terra aos pedidos meus… Confiou, soube que era Jesus, e falou ao mundo. Não posso fazer mais. Não posso ter mais dó dos filhos meus.”

Vi que Jesus inclinava para a terra a sua sacrossanta cabeça como quem ia a cair. Estendi-Lhe os braços a ampará-Lo e disse-Lhe: Ó Jesus pousai nos meus braços, indignos braços, a Vossa sacrossanta cabeça, derramai sobre o meu coração as Vossas lágrimas. Ó Jesus, ó Jesus, quero que estes braços indignos, que tantas vezes foram instrumentos de pecado, sejam almofadas dessa sacrossanta cabeça cercada de espinhos. Não quero ver esse sangue, Jesus, vinde para o meu coração e deixai nele esses acerbos espinhos que cercam a Vossa bendita cabeça… Não choreis, Jesus, não choreis… Quero chorar eu… Porque chorais Vós, Jesus? Deixai-me chorar a mim que sou pecadora, e Vós sois o Senhor, o Senhor Jesus, sois o Inocente…

“Eu choro, Eu choro, minha querida filha, por não poder mais valer aos filhos meus. Eu amo-os e eles não Me amam. Eu quero-os e eles não Me querem. Eu quero perdoar-lhes, e eles não querem receber o Meu perdão”.

Querem, querem Jesus!... Aceitai todos os sofrimentos do mundo como se fossem meus… Aceitai todo o amor como se fora meu… tudo em união com as dores da Mãezinha e aos Vossos méritos, aos méritos da Vossa santa Paixão, meu Jesus. Formai escora que sustente o braço do Pai Celeste. Depressa; dizeis Vós; agora, digo eu: Esperai Vós… Vós dizeis “depressa” para que se convertam; e eu digo: esperai, dai-lhes tempo, Jesus… Sou a Vossa vítima, sou a Vossa vítima e quero perdão para o mundo…

“Vem, vem, heroína, vem alma vitoriosa, vem pomba branca, forma o teu voo para o meu Divino Coração. Vai aqui a gota de Sangue do Meu Divino Coração, o Sangue que alimenta e dá vida, o Sangue que te faz dar a vida a milhões e milhões de almas…

Já passou, já corre em tuas veias nova vida, novas forças, novo amor. Fica com os meus espinhos, chora com as minhas lágrimas, vai para a tua cruz, sente a minha dor… Coragem, coragem… Jesus sempre atendeu e atende aos teus pedidos. Vai em paz”.

Obrigada, meu Jesus, obrigada.

26 de Janeiro de 1951 – Sexta-feira

Lá vem a morte sobre a minha morte. A minha alma divisa-a bem a caminhar para mim; traz consigo tudo o que é tormento, tudo o que é dor. Tenho medo, apavoro-me com todo este tormento. Quero falar e não posso: as forças não me ajudam. Para obedecer tenho que descrever o que me vai na alma e a ignorância não mo permite. Parece que não sé perdi a luz, mas todo o uso da razão que me tirou e tira toda a compreensão. Ó meu Deus, e eu sozinha, sem ninguém, como se estivesse por todos abandonada. Parece que não conheço a Deus e nunca d’Ele ouvi falar. Para onde foi? Onde está a Sua luz? Valei-me Jesus, valei-me Mãezinha, em tão dolorosas trevas, em tão tremenda morte. Estou no cimo das minhas torres moribundas. Os ventos sopram, as ondas agitadíssimas do mar tentam submergi-las. Parece que a mais alta e medonha montanha foi levantada no mar largo. Toda a qualidade de feras se apoderou dela para me devorarem a mim. As ondas agitadas parecem tocar o Céu; tudo cobrem, tudo destroem, só as feras mantêm o seu furor contra mim. Perdi tudo, tudo em mim morreu, até morta parece estar em mim a fé. Digo e repito, abandonada nos corações divinos de Jesus e da Mãezinha: não tenho querer, quero o que Eles querem, vou para onde Eles me quiserem levar e estou certa que dentro deles hei-de morrer, e as minhas contas a Jesus hei-de prestar. Dizendo isto, mais me firmo em Jesus, mais me firmo na Mãezinha, mais me seguro nos Seus divinos corações; sem confiar, mais n’Eles confio; sem amar mais os amo; sem viver, mais neles vivo. É n’Eles que me quero perder, é pelas ondas dos Seus Amores que eu quero ser destruída. Ontem, o meu coração não pôde deixar de sentir o Horto e o Calvário. Os olhos da alma não podiam perder esta visão. Não sei que força lá me prendia. Era já de tarde, senti como se sempre tivesse andado arredada do Calvário. E logo em seguida fi-lo, ou alguém o fez por mim, reverdecer e florir. Eu era a jardineira de tantas, tão belas e variadas flores.

Ardia de amor por elas, cuidava delas e cada uma regava com o sangue do meu coração. Logo em seguida, vi que elas queriam secar por si, desperdiçavam o meu sangue. Uma sebe de espinhos cingiu-me o coração; senti dor de morte, dor infinita. E no solo do Horto suei sangue, agonizei e com as minhas próprias mãos ofereci ao Eterno Pai o cálix da amargura a transbordar. Fui presa e para a prisão. Nesta manhã, antes do romper o dia, Jesus estampou-se no meu coração, manietado, desfiguradíssimo, estava ainda preso. Que pena eu tive de Jesus. Dali vi a montanha do Calvário e no cimo dela a cruz levantada ao alto. Não estava nela ninguém. Jesus fez-me compreender que era minha, que eu fosse para ela de boa vontade, fizesse dela o meu leito e nela me deixasse estar sempre crucificada. O meu coração seguiu a viagem, numa dor infinita, de longe a longe, gotejando sangue.

Ia desfalecida, parecia que a cada passo que eu dava uma nova volta de vara espinhosa me enleava e feria pungentemente o coração. Ia sedenta da cruz; dei como que um voo para ela e nela fiquei crucificada, a derramar sangue por todas as chagas e feridas, o coração a bradar num brado dolorosíssimo e de olhos fitos no Céu esperava o momento de ao Pai entregar o meu espírito. Meu Deus, meu Deus, que tremenda e triste agonia! Houve a separação. Pareceu-me que a alma deixou o corpo por algum tempo. Houve depois a renovação. Veio Jesus e deu-me vida e luz. Falou-me assim:

“Escutai, estai atentos… é Jesus que vai falar… falo pelos lábios da minha vítima, como falei outrora pelos lábios dos meus profetas… Estai atentos, atendei aos pedidos de Jesus… Quer amor, daquele amor puro, daquele amor baseado só em Mim. O meu Divino Coração exige um amor completo… o meu Divino Coração exige uma reparação contínua… sabes porquê, minha filha? Repara bem… fita o meu Divino Coração…”

Fitei-o, mas ao vê-Lo como O vi tão ferido, exclamei: Mas não posso, Jesus… Antes queria que essas lançadas fossem no meu. É rasgado uma e outra vez, é rasgado continuamente. Que pena! Deixai-me, Jesus, permiti-me que o solde… quero soldá-lo com as minhas indignas mãos. Com que cuidado e amor tomei o Coração amorosíssimo de Jesus aberto entre as minhas mãos. Fiquei como que se estivesse a orar numa prece fervorosa. Oh! como sou feliz!... Oh! que bom, Jesus…, ter nas minhas mãos o Vosso Divino Coração… Só isto é demais para o meu todo sofrer. Esta recompensa é tudo. Já não tendes nenhum ferimento, meu Amor? Passaste-lo todo para o meu… Só sofrendo estou bem, Jesus. Quero que seja o meu coração a receber todas as lançadas, tudo quanto Vos fere.

— É para isto, só para isto, filha querida, que o meu Divino Coração exige a reparação contínua. Os crimes são tantos, tão grandes e tão contínuos, não cessam um momento… Não cesses, minha filha, a dar-Me e a pedir reparação.

Estava cansada com o ferimento que no meu coração sentia. Jesus com cuidado inclinou-me para o Seu regaço e disse:

— Descansa, descansa em Mim, nos meus braços. Deixa aquecer-te com o calor do meu divino amor… Fortalece-te dele e vai depois dá-lo. Quero que todos os corações se incendeiem para com este amor puro e divino me amarem e repararem. Minha filha, minha filha, vítima ditosa deste calvário… Em ti reina a graça, em ti reina a Trindade Santíssima… Irradia em ti a luz do Divino Espírito Santo… fala nos teus lábios o Cristo Jesus. Feliz da alma que sofre… feliz da alma que ama. Feliz, em tudo feliz aquela que espera ser por Mim justificada… Dizei, minha filha, dizei, e só isto será compreendido… Permito o impossível para dar luz, para fazer luz… Quero as almas ao Meu serviço, à disposição das minhas ordens. Só Eu mando, só Eu governo, só Eu sou o Senhor… Vem, minha filha, receber a gota do meu Divino Sangue, alimento celeste, alimento divino que dá a vida ao teu corpo e à tua alma”.

Está tão grande o coração, Jesus. Fostes Vós que mo dilatastes?

“Dilatei-o para mais dor, dilatei-o para mais amor. Não temas a cruz. Não temas ser desprezada por Mim… Eu venho, venho já, venho breve exaltar-te, elevar-te a ti e a todos quantos contigo sofrem, e elevar-te ao paraíso. Recebe amor, recebe amor e vai em paz”.

Obrigada, obrigado meu Jesus.

   

 

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