Quando entrei para Filha de Maria
« Balasar, 27 de
Outubro de 1933
Senhor Padre
Pinho :
Não podia
deixá-lo ausentar-se de Braga sem lhe dizer alguma coisa de mim, e agradecer-lhe
as duas cartinhas que me mandou e um rico santinho de Nossa Senhora de Fátima
assim como as lembranças que recebi pela Senhora Teresa. Oh ! Como tudo isto vem
consolar a minha pobre alma, e quanto preciso me é para mais e mais amar a Nosso
Senhor, e espero que sempre me ajude na satisfação da minha alma, assim como tem
feito até aqui. Já que não tenho a infelicidade de não ter ao meu lado quem me
diga uma palavra que me console, mas graças ao meu querido Jesus que tenho lá de
longe quem me faça por mim tantas coisas. Mas que seria de mim, sem remédio para
o corpo e para a alma ?

Senhor Padre
Pinho, queria-lhe dizer muita coisa, mas não posso. O que me faz escrever é
muita força de vontade, pois continuo com todos os meus sofrimentos e este
mal-estar na espinha ; mas como a febre desceu, vou resistindo melhor.
Senhor Padre
Pinho, quer saber quando entrei para Filha de Maria ? Foi no dia 18. O manquinho
estava quase a arranjar de não ser, mas Nosso Senhor venceu. Aí lhe envio uma
pequenina lembrança desse dia.
Adeus, por
hoje ; fico esperando, ansiosa, o dia que me possa vir fazer uma visita. Muitas
lembranças da minha mãe e da Deolinda. Peço que me mande daí uma benção muito
especial para os meus pecados.
Esta que
continua sempre a pedir por Vossa Reverência.
Alexandrina
Maria da Costa ».
    
Chegámos à sexta
carta da Alexandrina ao Padre Mariano Pinho a quem ela chama ainda “Senhor Padre
Pinho” e “Vossa Reverência”, o título de “Paizinho” virá um pouco mais tarde.
Nessa ocasião o bom
sacerdote vai deixar Braga para o Fontão, onde o seu zelo apostólico o chama.
Alexandrina, sabendo-o, logo se preocupa em escrever-lhe, para “lhe dizer
alguma coisa de mim”, assim como para lhe agradecer as “duas cartinhas que
lhe mandou” assim como a pequena oferta que este lhe enviara pela Senhora Teresa
Matias : “Um rico santinho de Nossa Senhora de Fátima” e ainda “as
lembranças” que pela mesmo portadora lhe comunicava.
É evidente que
estas pequenas coisas fazem prazer, não tanto pelo valor material que possam
ter, mas pelo valor afectivo e espiritual que têm e procuram àquela que as
recebe.
“Oh ! Como tudo
isto vem consolar a minha pobre alma !”, exclama ela.
E bem ela precisa de consolação, porque os seus sofrimentos continuam.
Continuando, ela explica “quanto preciso lhe é para mais e mais amar a Nosso
Senhor”.
Mas depois, como se
quisesse mudar o que dizia para uma expressão mais em conformidade com o seu
estado espiritual e a ajuda que do Padre Pinho pode obter, ela diz ainda :
“espero que sempre me ajude na satisfação da minha alma, assim como tem feito
até aqui”.
O seu desejo seria
que o bom sacerdote estivesse mais perto dela, que mais vezes ela pudesse
“desabafar”, expor quanto lhe vai na alma, porque actualmente, diz ela, “não
tenho ao meu lado quem me diga uma palavra que me console”, uma palavra que
a fortaleça, mas paciência, se isso não pode ser como ela deseja, “graças ao
seu querido Jesus que tem lá de longe quem faça por ela tantas coisas” : o
Padre Pinho, o seu Paizinho espiritual.
E termina a sua
frase com esta constatação evidente : “Mas que seria de mim, sem remédio para
o corpo e para a alma ?”
Este afastamento do
bom Jesuíta, afastamento permitido pelo Senhor, era de vez em quando motivo de
preocupações particulares para a Alexandrina, visto que certas coisas não
queria, ou não podia dizê-las por escrito, esperando pois o próximo
encontro ― algumas vezes demorado ― com o seu Director para lhas poder explicar
de viva voz.
Encontramos nesta
carta um desses exemplos de impossibilidade de ir mais longe nas confidências :
“Senhor Padre Pinho, queria-lhe dizer muita coisa, mas não posso”. Este
“não posso” pode ser motivado pelo facto de ser sua irmã que escreve. Como já
dissemos, Alexandrina guarda ainda ciosamente muitas coisas no jardim secreto do
seu coração, coisas que não diz diante nem a ninguém a não ser ai seu Pai
espiritual; não porque queira mesmo escondê-las a sua irmã, mas porque, por
vergonha não ousa ainda dizê-las.
Porque deve “tudo”
escrever, ela escreve, porque a sua força de vontade é grande, mas custa-lhe,
porque “continua com todos os seu sofrimentos e o mal-estar na espinha”,
apesar da “febre ter descido”, o que lhe permite de melhor resistir.
O Padre Mariano
Pinho, que era já Director de Congregações Marianas perguntara à Alexandrina
desde quando ela era “Filha de Maria”, visto que essa inscrição na dita
Congregação dava-lhe um direito especial e particularmente desejado pela
“Doentinha da Balasar” : a Missa no seu quarto.
A entrada da
Alexandrina, segundo o que ela escreve, deixa também perceber uma outra
intervenção, uma das primeiras talvez : aquela do demónio.
“Foi no dia 18 ― explica
ela. O manquinho estava quase a arranjar de não ser, mas Nosso Senhor
venceu”. E, como para provar o que dizia, ela envia ao seu Director um
“santinho” com a devida inscrição e data.
Mas ela já não pode
mais e por isso mesmo termina a carta, não sem lembrar o bom sacerdote que o
espera e que o mais depressa seria o melhor :
“Adeus, por
hoje ; fico esperando, ansiosa, o dia que me possa vir fazer uma visita”.
Depois das
civilidades habituais, ele pede ainda um favor, uma graça particular, em claro,
uma absolvição dos seus pecados :
“Peço que me
mande daí uma benção muito especial para os meus pecados.
Esta que
continua sempre a pedir por Vossa Reverência.
Alexandrina
Maria da Costa”.
Ao terminar este
curto comentário, diremos como o seu bom Pai espiritual que fica aqui “bem em
evidência que a piedade da Alexandrina era eminentemente mariana” ;
a sua inscrição na Congregação das Filhas de Maria o prova.
|