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SENTIMENTOS DA ALMA

1952

OUTUBRO

2 de Outubro – Sexta-feira

Temo e tremo à vista de tanto abandono, tanta escuridão e inutilidade. O meu brado ao Céu é abafado pelo peso da dor e das humilhações. Quero fugir para onde não possa ser vista. Fico abatida, humilhadíssima, ao ver-me visitada e rodeada de pessoas. Muitos vêem em mim e julgam aquilo que eu não tenho e que eu não sou, não por mim, mas pela graça e misericórdia do Senhor. Mas muitos, em número muito mais elevadíssimo, pensam que sou, julgam, vêem em mim as virtudes, a santidade que eu não tenho, mas que gostava de ter por ser vontade do Senhor que sejamos perfeitos e santos. Estes, sem querer, sem terem essa intenção, fazem-me sofrer muito mais ainda que os outros. Eu nunca pensei, e graças ao Senhor, em querer parecer bem, passar por virtuosa aos olhos do mundo. Eu quero ser, sim, aquilo que Jesus quer, e nada mais. Queria amar a Jesus, a Mãezinha e dar-Lhes todas as almas. São as minhas ânsias, as minhas aspirações. Mas nada faço; a cada momento da minha vida sou roubada pela inutilidade. O que é bom não o tenho. O que é meu, toda a espécie de vícios, maldades e crimes, são meus. É meu todo o ódio da humanidade inteira contra Jesus ; são minhas todas as ofensas cometidas contra o Seu Divino Coração. O meu brado não chega ao Céu. Parece que ele para mim não existe. E, para maior desgraça, quantas vezes não sei quem tenta convencer-me de que ele não existe para ninguém. Valei-me, meu Deus, valei-me, meu Jesus. Na terra, não tenho quem me acuda ; e que será de mim se me faltais Vós ? Os meus sentimentos não cessam de dar a volta, percorrerem toda a humanidade, com a maldade e malícia mais pecaminosas. Entreguei-me à podridão do mundo. Ai, se eu soubesse dizer aquilo que me parece buscar e querer, como me parece saber praticar toda a qualidade de pecados, todos os lugares onde eles se podem cometer. Que horror, que escândalo, meu Deus ! Estas ânsias, desejos, olhares maldosos, chegam, por vezes, a deixarem-me na maior prostração, tal o cansaço que sinto no coração. São horas amargas, de luta constante. Depois de um tremendo combate, em que abandonei Deus por completo e me entreguei às mais cegas paixões, eu era as pessoas, via as pessoas, era o lugar da habitação e via esse lugar, dizia dentro de mim mesma: quero o prazer, quero gozar; não existe Deus; depois desta vida, tudo acaba, quero satisfazer-me enquanto aqui estou. Dizia isto para a minha companhia do pecado. Quando assim falava, fiquei sobre a boca do inferno. Veio alguém sobre mim, de braços abertos, como se viesse pregado na cruz. Não se poupou aos sofrimentos, não temeu cair também no inferno. Sustentada não sei por quê, voava como se tivesse asas. Arrancou-me da boca do inferno, das labaredas que já me atingiam. Fiquei libertada. E então Jesus chorava e parecia chorar dentro de mim e em profundo suspiros dizia :

— “Não te aproximes de mim, não me recebas nesse estado na Eucaristia, não me renoves mais vezes a minha santa Paixão. Converte-te e vem depois a Mim, não peques mais, ama-me”.

Fiquei como se não ouvisse a voz de Jesus, não tive nenhuma pena d’Ele ; embrutecida no vício não pensava deixá-Lo, tinha o propósito de nele continuar. Vai-se passando dentro de mim o sofrimento de há catorze anos, a data da minha primeira crucifixão. As vésperas, o dia e muitos mais após este, tudo mês está presente. A alma vai vivendo o sofrimento de cada dia, de cada hora. Sinto o que sofri, o que sofreu o meu Pai espiritual e mais alguém que me rodeava. Que tormento ! Se este fosse bem compreendido, não se teria erguido tão doloroso Calvário. Ó meu Jesus, tudo foi e é por Vosso amor. Sede a minha força e a força dos que sofrem por minha causa e comigo. Nesta agonia torturante, passei o meu Horto de ontem. Ao cair da tarde, fiquei como que plantada nele. Fui posta naquele solo duro, para ser responsável por toda a gente e para duma grande parte ser escândalo. Estes eram revoltosos, carrascos e assassinos para mim. Ali recebi todos os maus tratos e ingratidões dos homens. Parecia que era do meu coração, mas não era, porque eu via à minha frente outro coração, embora muito unido ao meu, que derramava rios de sangue, e pelo centro saíam chamas de fogo ateadoras. Compreendi que era o fogo do amor de Jesus. Eram d’Ele estas chamas, era d’Ele este sangue que banhou o solo do Horto. E era Ele que louco de amor se oferecia por nós ao Eterno Pai e pela Sua justiça era esmagado. A noite foi um Calvário, e para o Calvário segui nesta manhã. Era uma agonia semelhante à de há catorze anos. Era um caminho sem luz, era um caminho sem guia, nem amparo, era uma agonia sem conforto, sem esperança, era uma agonia só de pavor. Cheguei ao cimo da montanha, fiquei na cruz crucificada. Jesus tomou a minha carne despedaçada, os meus ossos, todos os meus membros. Todo o meu ser foi Cristo crucificado. O Seu brado ao Pai passava pelo meu coração e pelos meus lábios. Perto de Jesus expirar, passou sobre mim uma onda fogo. Jesus dizia : “Venceu o amor, venceu o amor. Pai, nas tuas mãos entrego o Meu espírito.” Após um pouco dum silêncio mortal, a alma iluminou-se. Sentia em mim a vida de Jesus e ouvi-O falar assim :

— “Dá-me o teu coração, minha filha, e junto ao teu faz com que Me sejam oferecidos muitos corações, todos os corações. Está aqui o mendigo, o mendigo, o mendigo do amor. O mendigo da dor. Está aqui o mendigo que há tantos anos veio bater à porta do teu coração. Hoje, como nesse dia, venho pedir a mesma coisa. Quero o teu corpo e a tua alma para serem sempre comigo crucificados. Quero o teu corpo para ser o pára-raios de toda a humanidade. Quero a tua dor, formada em braseiro, para ser luz de todos os pecadores. Bati, bati à porta do teu coração generoso. Bati e fui atendido. Bati e tive entrada. Minha filha, minha querida filha, a hora é grave. Avante, avante, coragem na tua cruz, no teu Calvário. Eu pedi para te crucificar. São os meus desejos, são os meus anseios divinos que continuas nesta crucifixão. O mundo, o mundo, os pobres pecadores, obrigam-Me a todas as exigências, obrigam-me a crucificar-te com a mais dolorosa crucifixão. Coragem, minha filha. Sê apostola. Coragem, coragem, minha filha, sê missionária no teu leito de dor. É nobre a tua missão. É nobilíssima a tua dignidade de esposa de Cristo, de vítima de Cristo, de florinha eucarística, de mãe dos pecadores. Catorze anos são passados. Foi neste lugar, a esta hora, que há catorze anos foste crucificada, e neste momento tinha contigo os Meus desabafos. São catorze anos de glória, catorze anos de salvação, catorze anos de heroísmo, de amor às almas. Bem hajas, esposa minha, pela tua generosidade. Estreito-te ao Meu Divino Coração, pela tua entrega total. És minha, toda minha. Pertences-Me, amas-Me, e Eu amo-te! Sou teu e todo teu. Vem, minha esposa celeste, vem abraçar, vem beijar, vem unir-te à minha esposa e vítima, à vítima heróica deste Calvário, que sofre, luta, combate. À minha semelhança, tem salvo e continua a salvar muitas almas, milhões e milhões de almas. Minha irmã, minha querida irmã, aceita o meu abraço, o meu íntimo abraço. Aceita os meus beijos, os meus celestes beijos”.

— Teresinha, Teresinha, minha querida amiga, roga por mim ao Senhor. Ama por mim Jesus, ama por mim a toda a Santíssima Trindade, ama por mim a querida Mãezinha. Teresinha, Teresinha, minha querida amiga, quero abraçar-te, quero estreitar-te muito ao meu pobrezinho coração. Vela por mim, ajuda-me na minha cruz, no meu calvário. Quero, quero abraçar-te e não mais separar-me de ti. Ah ! se eu fosse contigo para o Céu!... Já lá estaria com certeza, se como tu soubesse amar, se como tu soubesse sofrer e mais ainda se como tu soubesse ser pura e santa. Obrigada, obrigada, minha querida Teresinha, pela tua chuva de rosas.

— “Tem coragem e confia. Será breve, muito breve, que eu virei com a minha e tua Mãe, a nossa Mãe e Rainha celeste, levar-te para o Paraíso. Confia. Ama-te o Céu com a maior loucura de amor. Vem, minha filha, depois deste mimo celeste, receber a gota do meu divino sangue. É a vida que passa, é o amor que te inunda e fortalece. Coragem, coragem. Quem muito dá muito quer receber. Dou-te tudo, dou-Me todo a ti. Fica na tua cruz. Dá-te dela, sempre, toda a mim. Com ela, com este sofrimento inigualável, dá-Me às almas, dá-Me às almas, todas as almas. Acode, acode ao mundo perdido. Pede oração, muita oração, muita penitência. Vai em paz. Coragem na tua dor, coragem na tua imolação, no teu Calvário”.

— Obrigada, Jesus, obrigada, meu amor. Antes de Vos deixar, antes de me separar de Vós, ou de sentir a Vossa separação, lembro-Vos, meu Amor, todos os que me são queridos. Ponho tudo, tudo, diante de Vós. Todos os que se me recomendam, toda a humanidade, porque toda ela é Vossa. Ficai comigo, é Jesus, triunfai na minha cruz !

4 de Outubro – Primeiro Sábado

Passei a noite numa ansiedade indizível de receber a Jesus e, ao mesmo tempo, numa dor angustiosa pela hora da Sua visita ao meu pobre coração. Temo os colóquios com Jesus. Parece que chego a querer libertar-me de tudo. Temo os colóquios, porque temo enganar-me. Tenho dúvidas de todo o meu viver. Apavoram-me as sextas-feiras e os primeiros sábados. Meu Deus, eu não quero enganar-me, nem enganar ninguém. Não consintais em tal, meu Jesus. Ele veio, e, logo que O recebi, o temor desapareceu-me, dissipando-se as trevas. A Sua presença em mim iluminou-me o coração, encheu-me de paz, abrasou-me toda no Seu Divino Amor. Após uns momentos, falou-me assim :

— “Vim ao mundo trazer a paz. Quero dar a todos a minha paz. Minha filha, minha filha, o Rei Divino está no palácio do teu coração, sentado no trono da maior realeza. Este trono está adornado das mais puras e heróicas virtudes. O perfume é delicioso, tem o aroma das rosas. Aqui, minha filha, sim, neste trono encantador, Eu posso esquecer os crimes com que sou ofendido. É deste trono que Eu falo, é daqui que Eu suplico. Coragem, coragem, a dor é o escudo da salvação. Dá-Me almas, dá-Me almas, não mas deixes fugir, não mas deixes perderem-se. Tenho sede, tenho sede de ser amado. Estou cheio e enfartado de ser ofendido. Dá-Me almas, minha filha. Com os teus sofrimentos, conquista-as para Mim. Eu faço, esposa querida, que elas corram para junto de ti, como as formiguinhas para o seu celeiro. O teu coração é celeiro divino. Está cheio, todo cheio, transborda das maravilhas, graças e tesoiros do Céu. As almas, as almas, vêm junto de ti. Vêm ao celeiro do teu coração buscar alimento para se alimentarem e viverem de Mim. Quantas, minha filha ! Quantas !... Se tu pudesses ver !... Vêm para aqui umas e vão tão transformadas!... Ai daquelas que se opõem aos meios que Jesus escolheu para as salvar! Utilizei-Me deste calvário riquíssimo, calvário de salvação, para lhes acudir. As almas são minhas, custaram o sangue divino. Quero que se salve aquilo que é meu. Diz, diz ao teu Paizinho que uni a vossa dor na mesma união, na mesma intensidade, que uni as vossas almas. Ele há-de ser contado no número dos meus santos. Foi escolhido para eleito do Senhor, mas para isso tem de passar a sua vida na terra calcando espinhos, trespassado de espinhos. A sua missão, a missão das almas, para a qual o escolhi, é a mais árdua, a mais difícil, a mais dolorosa. Diz-lhe que o amo com todo o meu amor. Se assim o não amasse, não o teria escolhido para tal fim. Dou-lhe toda a minha paz, todo o amor e doçura do meu divino Coração. Diz, diz ao teu médico que Jesus visita sempre os amigos que mais ama. Diz-lhe que Jesus bate à porta, com mais intensidade, daqueles de quem espera tudo. Diz-lhe, diz-lhe que o meu Divino Coração tem por ele e pelo seu jardim florido especial afeição. Diz-lhe que é grande a recompensa que o espera. Não posso deixar de o compensar pela sua firmeza heróica, pela sua fidelidade e amparo à minha divina causa. Diz-lhe que tenha coragem. Ela triunfará. Diz-lhe que não cesso, dia e noite, de velar por ele, de cuidar dele e dos que são dele. Dá-lhe a chuva das minhas graças. Dá-lhe a abundância do meu amor e diz-lhe mais uma vez: mãos à obra, mãos à obra. Jesus o quer. Diz à minha filha atribulada que a acompanho, que o Senhor está com ela e lhe dá toda a Sua paz e o amor do Seu coração. Diz-lhe que os seus caminhos estão traçados, traçados por mim. Ela está bem como Eu quero e onde quero. Diz-lhe que ela tem sido fidelíssima à vontade santíssima do Meu Divino Coração. Diz-lhe que lhe dou toda a paz, que a feche bem no seu coração. Avante, avante sempre, sempre a velar na missão que lhe destinei. Vem, minha Bendita Mãe, Mãe do Rosário, Mãe da salvação, vem consolar a nossa filhinha. Vem confortá-la, encorajá-la. Os seus caminhos são os mais espinhosos e difíceis de romper. Minha filha, minha querida filhinha, esposa amada, esposa de Jesus, estás no regaço da tua Mãezinha celeste. É Ela a estreitar-te, a acariciar-te, a acalentar-te ao Seu Santíssimo Coração. É a Virgem Celeste, a tua Mãezinha querida a quem tanto amas, a quem tanto queres, que vai pela segunda vez enlear nas tuas mãos o rosário bendito, o rosário da salvação. Aconselha, faz que ele seja rezado. O Rosário bem rezado e bem meditado, com os teus sofrimentos, são a salvação dos pecadores, são a salvação da humanidade. Ai dela, ai dela, se depressa não corresponde às graças do Céu, às graças e protecção de Jesus e de Maria. Coragem, minha filha querida. Está atenta sempre, sempre, a tudo o que Jesus te pede. Nada Lhe recuses. Dá-Lhe toda a dor. O mundo, os pecadores, assim o exigem. Conta com Jesus, conta comigo. Velamos por ti, amparamos-te. Estás sempre mergulhada no amor infindo dos Nossos Corações. Não o sentes, mas estás. É nesse estado de alma que dás a maior honra, a maior glória, a maior prova de amor a Jesus e a Maria. É nesse estado de alma que o Eterno Pai recebe de ti a reparação, com a abundância que apode dar uma criatura humana”.

— Ó Mãezinha, quero abraçar-Vos e beijar-Vos. Eu não sou digna, eu não sou digna, perdoai-me.

— “Recebe as novas carícias de Jesus. Recebe o conforto, as carícias e toda a doçura da tua Mãezinha. Dá, minha filha, dá, minha filha, a todos os que amas, a todos os que te amparam e rodeiam o amor e doçura da tua Bendita Mãe. Espalha-os a todos os que se aproximam de ti. Faz que se espalhem no mundo inteiro”.

— Obrigada, Jesus, obrigada, Mãezinha. Sede sempre comigo.

10 de Outubro – Sexta-feira

Passo a vida mergulhada num mar agitadíssimo de dor. É o mundo inteiro transformado em água, é o mundo inteiro esse mar infindo de sofrimento. A dor mergulha-me lá para os abismos. Só de longe a longe, movida e removida pelas ondas, chego quase à superfície da água ; só os braços consigo deitar de fora. Este esforço da minha parte, este mostrar e abrir de braços, é um sinal de pedir socorro. Parece que é para o Céu que eu os abro e levanto. Na terra não tenho ninguém que possa entrar por entre as ondas a abeirar-se de mim. Tudo é mar, tudo é revolta. Ao estender os braços, como que a pedir auxílio, chego quase que a respirar, libertada da dor, do sofrimento. Mas, ao mesmo tempo, sem o Céu me salvar, volto a infundir-me pelo peso inaudito da dor. Nem da terra, nem do Céu posso ter salvação. Lá vou eu, parece que passo anos e anos a lutar com as ondas sem poder conseguir vir à superfície a pedir de novo auxílio. Entregue à mercê da água, desfalecida, já não procuro esforçar-me para ser salva. Eu queria desabafar, sinto a necessidade de dizer o que é este mar de sofrimento e como eu sou submergida nas ondas. A inutilidade rouba-me toda a luz, todo o esforço que eu fazer para me salvar. A ignorância não me larga. E, assim, eu fico sem ter lenitivo para a minha alma. Não me faço compreender, não posso fazer nenhum bem. Estas ondas são para mim piores do que a lepra; roem-me, desfazem-me todo o ser. Mas ainda tenho um coração e uma alma que anseiam servir e amar o meu Senhor, entregar-me a mim e em tudo fazer a Sua Divina Vontade. Digo isto, não pelos sentimentos, mas sim pela confiança e pelo abandono a que me entreguei. Eu não sei se amo a Jesus, mas Ele sabe que eu quero amá-Lo. Eu não sei se faço a Sua divina vontade, mas Ele sabe bem a perfeição com que eu quero fazê-la. Eu não sei se sigo os Seus caminhos, mas não importa, porque eu confio, sem sentir que confio, e espero no Senhor que hei-de confiar até ao meu último momento. Abandonei-me a Jesus e à Mãezinha e vou para onde Eles me levarem. Não quero as honras do mundo, nem o louvor das criaturas ; não me importa ser odiada, humilhada, incompreendida e desprezada por todos, o que eu quero é amar a Jesus e dar-Lhe as almas. E para isso tudo espero d’Ele. Temo a minha miséria e fraqueza, duvido de toda a minha vida, que tudo é engano, ilusão, falsidade, mas tudo isto sem eu querer. O que eu não posso é consentir no pensamento que Jesus, vendo-me, como sei que vê, que o único fim da minha vida é Ele, me deixe abandonada. O meu coração quer falar ao mundo. Que ânsias infinitas da fazer conhecer o Coração Divino de Jesus, de dizer o quanto Ele nos ama e o quanto se sente quando O ofendemos. Ó meu Jesus, meu Jesus, como sangra o Vosso Divino Coração! Como sofreis, meu doce Amor, ao verdes o mundo dos meus crimes, o mundo das minhas paixões, o mundo de todas as maldades, o mundo da mais nojenta podridão. Não disse nada e nada sei e quase nada estou a poder dizer. Mostrai, Jesus, fazei compreender, para Vossa glória e bem das almas, aquela infinidade de coisas que eu sinto necessidade de saber exprimir. Parece que o meu coração não cessa de as mostrar, de as escrever. O meu Horto de ontem foi o da inutilidade e do esquecimento, com um completo desprezo. Á noite, toda a humanidade, de lança em punho, rasgou-me o peito, abriu-me o coração. Toda a terra ficou regada com o seu sangue. O coração assim aberto era um abismo de amor, era uma lição nunca aprendida nem compreendida, era um asilo para todo o mundo cruel. O mundo fui eu, a cruel fui eu, quem tirou a vida a Jesus fui eu, só eu. Que pavor, meu Deus, que pavor! A noite foi um tormento de sofrimento para o corpo, mas foi melhor para a passar unida a Jesus. Hoje, logo de manhãzinha, não fui eu, mas foi o meu coração. Alguém o levou para acompanhar a Jesus de tribunal em tribunal. Ele foi testemunha de quanto Jesus sofreu! Para melhor dizer, os tribunais pareciam-me que estavam no meu coração, e ao mesmo tempo eu fui que lavrei a sentença de Jesus, fui eu que Lhe coloquei a cruz aos ombros e O fiz, debaixo de todos os maus tratos, caminhar para o Calvário ; à parte sempre a minha inutilidade para o bem e a utilidade, como autora de todo o mal. No cimo do Calvário, crucifiquei o meu Amado. Ia dentro em pouco dar-Lhe a morte. O Seu Divino Coração aberto era um mundo infinito de amor. O Seu brado ao Eterno Pai, ao mesmo tempo que era brado do abandono, era-o de convite a entrarmos nele para dele recebermos o perdão. Quanto mais Jesus bradava, mas eu compreendia o Seu amor e mais ele se submetia à vontade do Pai. A ela submetida para responder por toda a humanidade ao Céu, entregou o Seu espírito. A minha alma sentiu um trespasse de morte para depressa despertar para a vida ao ouvir a voz de Jesus e ser iluminada pela Sua luz divina.

— “Alerta, alerta. Olhos ao Céu, coração humilde, coração resignado à vontade santíssima de Deus. Alerta, alerta! Estai bem atentos. Alerta, alerta! Escutai, escutai! É Jesus quem fala. É Jesus, sim, Jesus no Calvário, na Sua esposa e vítima. É no Calvário que Ele está. É no coração da Sua florinha eucarística que Ele habita. É pelos seus lábios que Ele pede. Tenho sede! Quem poderá saciar-ma ?... Tenho fome ! Quem poderá satisfazer-me ? Os corações puros, os corações sequiosos de Mim, os corações e as almas reparadoras. Tenho sede de amor, tenho fome das almas. Ó minha filha, ó minha filha, alma da mais elevada eleição, o Senhor é contigo. Foste criada para a mais alta e difícil missão e para esposa de Jesus Cristo. Foste criada e escolhida por Deus, para seres a cópia fiel, a vítima mais semelhante de Cristo crucificado. A tua missão é nobre, é nobilíssima. O Céu exulta de alegria na contemplação do farol luminoso, da luz brilhante de toda a humanidade. É a vítima salvadora das almas. Coragem, coragem, minha filha, escuta a voz de Jesus que te ama e anseia que O faças amar. Sofre, sofre com alegria. Sofre com heroísmo. Tu és, esposa minha, a ave escondida, escondida, sim, escondida, escondida e seres visitada, escondida e seres contemplada. Escondida, sim, minha filha, porque poucos vêem em ti a graça e as virtudes, as maravilhas e os tesouros que em ti estão encerrados. Tu és o sol, o sol brilhante, encoberto por uma nuvenzinha que há-de romper, que há-de ser rasgado para que os raios luminosos vão penetrar, vão iluminar todos os corações, todas as almas através dos tempos. A tua vida há-de chegar dum pólo ao outro do mundo, como o reinado de Cristo crucificado. Dá-Me dor, dá-Me dor, minha filha, aquela dor que abrande a justiça do Senhor, aquela dor que apague o seu fogo vingador, aquela dor que dê ao mundo uma vida nova, aquela dor que arranca às garras de Satanás os milhares, os milhões, os milhões, os milhões de grandes e perversos pecadores. Alerta, alerta, ouvi, almas vítimas, ouvi, almas amantes do Senhor. Vinde depressa, vinde com urgência, antes de ecoar o trovão da destruição. Salvai as almas, salvai as almas. Consolai a Jesus, aplacai a justiça do Senhor”.

— Ó meu Jesus, meu Jesus, estou confundida. Não sei o que hei-de dizer-Vos. Digo-Vos que sou Vossa, que sou a Vossa vítima e que conto convosco para em tudo ser fiel à Vossa Divina Vontade. Dai-me graça, Jesus, dai-me amor à cruz.

— “Vem, minha filha, vem, esposa minha, receber a gota do meu divino sangue. Ó maravilha, ó maravilha extasiante! Uma nova gota de sangue de Jesus corre pelas veias da Sua esposa e vítima. É sangue que dá a vida, a vida que gera as virgens e as faz crescer na graça e no amor. Fica na cruz, minha filha, ama-me, ama-me. É nela que provas o teu amor a Jesus, o teu amor às almas. Coragem! Vai em paz. Vai pedir, sem cessar, penitência, emenda de vida”.

— Obrigada, meu Jesus, obrigada, meu Amor. Atendei às minhas preces. Vede todos os meus pedidos. Por último, é o mundo, é o mundo, meu Jesus. Compadecei-Vos dele.

17 de Outubro – Sexta-feira

Parece-me que não tenho fé. E, umas vezes, vivo como se nunca a tivesse nem a conhecesse, e outras como que a tivesse e a perdesse. Esta vida, com o seu breve, dá-me tempo para tudo, tudo, mesmo tudo do que é para o pecado. Sou um mundo maldades, vícios, ódios, um mundo de ofensas ao Senhor, um mundo de perdição. Tenho tempo para tudo o que é mau, tenho em mim todo o veneno e parece que conheço toda a variedade de crimes, tenho toda a maldade e sabedoria como eles são praticados. Para o que é bem, ó meu Deus, para Vos servir e amar, não tenho um momento. Que desespero, que inferno, por vezes dentro de mim ! Ao ouvir, no dia 13, a transmissão de Fátima, às invocações não desesperei, porque Jesus e a Mãezinha velaram por mim. Quando ouvia “Meu Deus, creio em Vós, mas aumentai a minha Fé” parecia-me que dentro de mim se repetia : não creio, não creio, não tenho Fé. O meu sentimento era de que não havia ninguém no mundo como eu. Não tinha força para chamar por Jesus e pela Mãezinha. As lágrimas bailaram-me nos olhos, tentaram vencer-me, rolaram-me pelas faces. O abandono do Céu e da terra prevalecem em mim. O martírio do corpo é contínuo, mas a agonia da alma não é menos assídua, custa mais ainda. A tempestade não cessa. As ondas agitadíssimas do mar enrolam-se sempre nelas, levam-me lá para os abismos. As trevas da noite, unidas à inutilidade, são pavorosas. Com tudo isto no coração e na alma, a paz acentua-se no mais íntimo. O inferno, o desespero, estão na superfície, só por momentos encobrem a tranquilidade e a paz que habita no alojamento mais fundo. Quando assim é, estremeço ao parecer que sou lançada no abismo da perdição. Não sei de onde, vem do alto como que uma corda que me atrai a si. Parece que os meus braços se firmam nela, e, como que se tivesse de degraus, de longe a longe, vou passando um, apesar de estar sempre no mesmo sítio. Este sentimento é bálsamo para as feridas de muitas, muitas punhaladas, e de muitos, muitos espinhos. Meu Jesus, como é vasto o jardim dos Vossos sofrimentos ! Não tem conta a variedade de tão dolorosas, mas tão amadas flores ! Amo, amo tudo o que é Vosso, tudo o que me enviais. Dai-me graça e força, Senhor, só em Vós confio. O meu Horto de ontem foi um verdadeiro pavor! Eu era como que envolta, amassada, calcada por toda a terra. Temia os sofrimentos, temia a Deus mais do que a própria morte. Prostrada no solo do Jardim das Oliveiras, dizia não sei quem dentro de mim: a minha alma está triste até à morte. E tal era a tristeza que me levava a manifestá-la, a desabafá-la. Via ao longe, mas como se fosse dentro de mim, a Mãezinha das Dores a contemplar-me. Via o Céu fechado, o mundo feito um rochedo, sem nele poder penetrar, e todos os sofrimentos que me esperavam. Suei sangue; só com ele tal dureza podia ser amolecida. Nesta manhã, temerosa de Jesus e dos meus colóquios com Ele, d’Ele queria fugir e esconder-me. Segui para o Calvário, mas fui forçada. Não segui a Jesus com amor; senti em mim uma revolta imensa contra Ele. Sempre a inutilidade a dominar-me para toda a Sua vida, para tudo o que era d’Ele. No cimo da montanha, Jesus estava crucificado na cruz. E eu não fiz outra coisa a não ser cobri-Lo de insultos e atirar-me a Ele, como a fera mais furiosa. Eu era a fera mundial e ia tirar-Lhe a vida. Jesus amava, amava profunda e loucamente. A cada brado ao Seu Eterno Pai, a cada afronta, repetida uma e outra vez à Sua Divindade, o Seu Coração parecia esquecer. O amor superabundava tudo. Quando Ele bradava em dolorosa agonia, o Seu amantíssimo Coração jorrava sangue que regava a terra em abundância, e junto ao sangue saíam fortes labaredas de fogo, que se ateavam e pareciam incendiar o mundo. No meio de indizível afronta e sofrimento, Jesus amava e a todos perdoava. Vi-O suar sangue e senti na minha alma que os Seus suores eram os suores frios da morte. Ele expirou, e a minha alma com Ele. Tudo ficou silencioso, como se morresse toda a terra. Veio o meu Amado, deu-me a Sua vida, deu luz à luz escura do meu coração e falou-me assim:

— “Minha filha, minha filha, estou aqui no teu coração. Escuta o Jesus da tristeza, o Jesus da dor, o Jesus da compaixão, o Jesus do amor, o Jesus do perdão. Minha filha, minha filha, estou aqui e é no teu coração que Eu falo aos pecadores, que Eu falo ao mundo inteiro. Eu amo, Eu amo a humanidade, infinitamente, divinamente. Eu amo e não sou amado. Eu amo e ela não corresponde ao meu amor. O mundo, o mundo, minha filha, é o cruel do teu Calvário como outrora o foi do meu. O mundo, o mundo infiel, é a causa da tua imolação tão dolorosa e sangrenta. Eu sou o Jesus ofendido. Eu sou o Jesus ultrajado e venho ao teu coração pedir amor, amor, amor de muitos corações, de milhões de corações, amor dum universo de corações. Tenho sede, tenho sede, tenho sede de amor, sede de reparação. Conquista, minha filha, conquista muitas almas para Mim. Pede, para que Eu seja amado e seja reparado. Eu quero apresentar a meu Eterno Pai corpos e almas reparadoras, corações transformados em sacrários vivos, com hóstias imoladas, abrasadas em amor. Eu venho ao teu coração, minha filha, não só deliciar-me no jardim das tuas virtudes, no seu perfume delicioso, no fogo ateador que as rodeia e faz crescer, mas sim pedir-te, pedir-te sempre dor, mais dor, para essa dor incendiar nos corações ânsias de sofrimentos, ânsias de reparação, ânsias de amor mais elevado”.

— Ó meu Jesus, meu Jesus, eu estou pronta, sempre pronta a fazer a Vossa Divina Vontade, a pôr sempre em prática os Vossos divinos desejos. Não conto comigo, Jesus. Não conto com as minhas forças, mas conto convosco, com a Vossa graça, com o Vosso amor, meu Jesus. Se eu soubesse ser fiel à Vossa Santíssima vontade ! Se eu soubesse viver dia a dia, momento a momento, a Vossa vida divina, a Vossa vida de amor e servir-Vos fielmente !... Pobre de mim, Jesus ! Não sei sofrer, nem sei amar o Vosso Divino Coração ! Não sei sofrer, nem fazer a Vossa Santa vontade. Perdoai-me, Jesus, perdoai-me. Guiai-me, encaminhai-me nos Vossos caminhos. Ó meu Jesus, bendito sejais ! O meu coração é um oceano infinito de amor. Estou abrasada e queimada nas Vossas chamas. Sinto que sou grande como Vós. Tenho em mim o Céu com todo o poder.

— “Tens, minha filha, tens o Céu, porque tens Jesus. És poderosa com o Meu poder. Ardes no oceano do amor; fui Eu que te comuniquei. Dei-Me todo a ti, tal qual Eu sou, para que me dês às almas, como Eu a ti me dou. Ó mundo, ó mundo ingrato e cruel ! Que pode fazer mais por ti Jesus, para te salvar ? Não tenho entrada nos corações empedernidos, directamente. Procuro entrar pela minha vítima, florinha eucarística, pelo crucificado deste doloroso Calvário, mas tão querido, o mais querido ao meu Divino Coração. Vem, minha filha, receber a gota do meu Divino Sangue. Mais uma gota para a vida, para a vida de que tu vives, mais uma prova da minha predilecção por ti, mais uma nova vida, nova força para a missão que te escolhi. Coragem, coragem, minha filha. Fica na cruz. Fala às almas. Conquista-as para Mim. Tu és o íman que as atrai, para por ti virem sequiosas ao Meu Divino coração. Coragem ! Diz ao mundo que Jesus está triste, o Eterno Pai está irado. Converte-te depressa. Ai de ti se não vives nova vida. Atende, atende, são ameaças do Senhor! É Jesus a avisar-te, a prevenir-te pelos lábios da Sua vítima”.

— Obrigada, meu Jesus. Estão presentes no meu coração todas as intenções, tudo, tudo. Atendei às minhas preces. Cedei aos meus pedidos. Obrigada, meu Jesus.

24 de Outubro – Sexta-feira

Estou no meu Calvário. É-me difícil vencê-lo. Por mim, não posso, meu Deus, sei que não posso. Vou ser breve, muito breve nas minhas palavras, na impossibilidade de o poder fazer. Cada esforço que faço para pronunciar uma palavra, todo o meu ser parece desfazer-se, tal é o sofrimento que em mim sinto. Ó Jesus, tudo por Vosso amor e para a salvação da almas. Que todo o meu viver seja sofrer e amar-Vos, amar-Vos e sofrer! Sem a dor, jamais poderia viver. Sinto necessidade de abrir a minha alma e queria quem me soubesse compreender. Não tenho ninguém, o abandono é completo. Vem do Céu e das criaturas. Meu Deus, parece que estou sozinha no mundo.  XE "Fé : parece que não acredito" É quase constante a minha dúvida e grande tentação contra a Fé. Parece que não acredito na existência de Deus, nos Seus mistérios, na Sua doutrina, na Sua Lei. Duvido de mim, de todo o meu viver, e parece-me ter igual dúvida da vida e existência de Jesus. Creio sem crer, confio sem confiar que não há-de ser assim, que não hei-de ofender o meu Senhor com tais dúvidas, com tais sentimentos. Isto me atormenta triste e dolorosamente a minha alma. Parece-me que são constantes as minhas ânsias de pecar, de me dar ao mundo e aos seus prazeres. Busco por toda a parte as melhores ocasiões, as mais variadas formas de satisfazer as minhas paixões. Ó meu Deus, o que se passa em mim, no mundo do meu corpo ! Tenho em mim estampadas todas as figuras indecentes que convidam e ensinam o mal. Ai, que  tormento ! Ai, que pavor ! Não posso e sou ignorante. Ai, se eu pudesse esconder-me, sem fugir à minha cruz! Se eu não pudesse não ser visitada, viver na oração e no recolhimento, sem com isto deixar de amar e fazer a vontade do meu Jesus! Não tenho querer, não tenho escolher, Jesus. Sou a Vossa vítima. Ontem, no mundo da minha inutilidade fiquei encaixada, infundi-me num Horto de gelo. Eram dois mundos num só mundo, gelo e inutilidade. Ali, gelada, vi o Calvário de Jesus. Vi-O a ser despido, escarnecido e debaixo dos sofrimentos mais atrozes a ser crucificado. Comecei então a suar sangue. Levantei-me com os cabelos e os vestidos nele ensopados. E mais uma vez me ofereci ao Pai, sem que Ele afastasse o cálice da amargura. Vi os tribunais e a multidão ingrata que ia pedir a condenação de Jesus. Fiz-Lhe companhia o mais que pude, durante a noite. Nesta manhã, Ele seguiu para o Calvário, levando a cruz aos ombros. E eu, como se não tivesse coração, não O acompanhei, deixei-O seguir sozinho. Segui na inutilidade os caminhos dos vícios e da perdição, para os quais eu sou útil, os quais amo sem amar, para os quais tenho ciência para toda a espécie de crimes e maldades. Jesus, quase no cimo da montanha, fitou-me ao longe, penetraram em mim os Seus olhares, atraiu-me para Ele e numa dor indizível, infinita, murmurou baixinho: “vem cá, vem a mim, vou morrer por ti, vou dar-te o Céu”. Principiei a caminhar para Ele. Cheguei ao Seu encontro e com Ele fui crucificada. Durante as horas da agonia, eu era como o ladrão da esquerda. Estava com Jesus e sempre revoltosa contra Ele. Bradava com Ele ao Pai e com Ele entreguei o meu espírito. E, neste mesmo momento, fui eu a cravar-Lhe no coração a última lançada. Jesus triunfou da morte e fez-me triunfar com Ele. Caiu sobre mim um incêndio de amor. Vivi com a Sua vida e ouvi o que Ele me dizia :

— “Desci do Céu, abrasado em amor, entrei no teu coração e em amor te abrasei. Entrei e senti-me no meu trono tal qual eu sou. Fui Rei, sendo Rei deste trono de delícias. O Céu existe, minha filha. O Deu está dentro de ti. O Céu é Deus ! O Céu é o amor e a vida de Deus. Existe o Céu e habita em ti o Céu. Nunca fui, nem jamais serei expulso do teu coração. É dele que Eu falo, é dele que Eu peço, é dele que Eu choro. Falo, falo e não sou ouvido. Peço, peço, não sou atendido. Choro, choro, choro e quase nenhumas almas se compadecem das minhas lágrimas. Falo, falo, quero ser reparado. Peço, peço, não quero ser ofendido. Quero emenda de vida. Choro, choro, choro sempre, choro continuamente. Vejo as almas a correrem para o abismo. Vejo-as em perigo eminente de caírem no inferno”.

— São duros os meus braços, Jesus. Não servem nada para apoio da Vossa sacrossanta cabeça. Inclinai-Vos, inclinai-Vos, meu Amor, sobre o meu pobre e frio coração. Quero abraçar-Vos. Quero enxugar-Vos as lágrimas. Quero acariciar-Vos, meu Jesus. É frio o meu coração, mas Vós podeis aquecê-lo. É pobre, Jesus, é pobríssimo, mas Vós podeis enriquecê-lo. Não tenho nada, nada com que enxugar-Vos as lágrimas. Dai-me o Vosso amor, Jesus, aceitai-o de novo como se fosse meu. Só com ele poderei estancar as Vossas lágrimas, só com ele elas podem secar. Não choreis mais, não choreis mais, meu Jesus. As minhas mãos não se movem, mas sinto que o meu pobre coração Vos acaricia. Que posso eu fazer, meu Jesus ? Quero ver-Vos alegre, sem chorardes, nem sofrerdes.

— “Minha filha, minha querida filha, recebi o teu apoio, as tuas carícias, o teu amor. Repara nos meus divinos olhos, já não têm lágrimas. Se muitas almas assim soubessem amar-Me ! Se muitas fossem heroínas como tu na reparação! Como é bela a alma sofredora! Como é forte a vítima deste Calvário ! Quero que o teu sorriso tenha o brilho do sol, os encantos das estrelas. Eu quero, sim, Eu quero que a minha vida em ti transpareça. Eu quero que o Meu amor por ti vá penetrar nos corações, como os raios do sol pela vidraça. Tu és vidro cristalino. Tu és espelho da humanidade. Tu és a fonte das graças e maravilhas do Senhor. Tu és o cofre das riquezas divinas. Eu quero, Eu quero que enriqueças as almas, abrases os corações. Eu permito que a ti atraiam as ovelhas, preço do meu sangue. Por ti elas vêm a Mim. Por ti saem do aprisco para pastarem no pasto mimoso do Meu Divino coração. Sofre, minha filha, sofre, minha pomba bela, florinha eucarística. Sofre, sofre, que a tua dor é preço de resgate. É com o valor do teu sofrimento que as almas são arrancadas a Satanás, ao inferno. Vem a Mim para o Paraíso. Recebe a gota do Meu Divino Sangue. Estão unidos, bem unidos, os nossos corações. São dois num só. É Jesus a viver no teu coração. É Jesus a falar no teu coração. É Jesus a amar. É Jesus em ti, contigo a salvar o mundo. Já corre a gotinha do sangue nas tuas veias. Tens em ti nova vida, novas forças, novo heroísmo. Sê forte, minha filha, sê forte! Fala ao mundo, fala com a voz de Jesus. Penitência, penitência, faça-se penitência. Vida nova, vida nova, vida pura. Penitência, penitência, reparação. Ó almas puras, ó corações amantes, aplacai depressa, aplacai sem cessar a justiça do Senhor. Fica na cruz, minha filha. Sorri à dor. Vive alegre na dor. Coragem, coragem ! Jesus é contigo. Coragem, coragem ! Eu não demoro a vir buscar-te para o Céu !”

— Obrigada, Jesus, obrigada, meu Amor.

31 de Outubro – Sexta-feira

Não posso ditar. O meu corpo está como um trapo desfeito; está desfeito e destruído pela dor. O pior ainda é que nem para ele nem para a alma há um olhar de compaixão. Parece que todos me odeiam, escarnecem, desprezam, deixando-me entregue a um completo abandono. Louvado seja o Senhor ! Ah ! Se a dor fosse compreendida, sem nenhum custo, como ela podia ser suavizada! Curvo-me à vontade santíssima do Senhor, louvo-O e bendigo-O por tudo. Vou passando o meu desterro à mercê das ondas; estas, numa fúria inaudita, levam-me à profundidade do mar. Aí fico perdida, sem socorro da terra nem do Céu. Meu Deus, meu deus, todo o meu ser, o corpo e a alma, estão apunhalados, alanceados, cobertos de espinhos ! é inútil o meu brado. A minha confiança em Deus parece estar perdida, o que espero na Sua infinita misericórdia não seja assim. Odeio o Senhor com a Sua Lei, se é que Ele existe. Odeio o Seu amor, não quero aceitá-lo e ao mesmo tempo anseio amá-Lo e perder-me n’Ele. O pecado, amo-o, abraço-o, sou a autora dele. De mim nasceram e nascem toda a variedade de crimes e de vícios. Senhor meu, que pavor! Que mundo infinito de maldades! E que dor infinita eu sinto no coração, ao contemplá-las! Esta visão é de Jesus, não é minha. Eu parece que não tenho coração. É o d’Ele que está em mim a sofrer. A inutilidade, meu Deus, a inutilidade roubou-me e continua a roubar-me tudo. Não posso chegar a ver nem a possuir nada. Ontem, sobre o solo do Horto, levantou-se uma torre de ódio, de inveja, de orgulho e todas as espécies de pecados. Era imensa esta torre e eu reinava nela. E, não só satisfeita com o domínio do mundo, tentava o domínio de Deus. Queria ser mais que Ele. Oferecei-me por tudo ao Eterno Pai e logo desci à terra, abracei-a num excesso de amor. Preguei, evangelizei. Naquele mesmo lugar, o Eterno Pai descia como numa nuvem. Esta desfazia-se sobre mim. Era nuvem de justiça esmagadora. Os olhares e semblante do Pai Eterno eram pavorosos ! Fizeram-me suar sangue. Não deixei de me oferecer a Ele novamente. Amava tanto ! Oh ! Como Jesus amava ! Nas longas horas de atrozes sofrimentos, unida ao amantíssimo Jesus, ofereci-Lhos todos. Ele parecia não os aceitar. Nesta manhã a cena seguiu. Jesus nada aceitava de mim. E eu fugi d’Ele, fugi sempre. O coração e a alma sofriam unidos, uma dor que lábios nem língua humana são capazes de exprimir. A inutilidade comigo, sempre comigo. No alto do Calvário, Jesus estava na cruz. Fui lá dar sem saber como. Fiquei presa à cruz de Jesus, bem contra a minha vontade; queria fugir-Lhe a todo o custo, ainda que para isso Lhe causasse os maiores e mais angustiosos sofrimentos. Ó anjos do Céu, dizei vós por mim a dor que causei a Jesus, quando assim procedi. Ela era tão grande, tão grande que enchia mundos e céus. As Suas lágrimas caíam nas minhas faces. Os suspiros saíam do meu peito como vindo do Seu divino Coração, indizivelmente, infinitamente ferido. Toda a terra parecia estar banhada no sangue do Divino Redentor. O abandono e ao mesmo tempo o peso da justiça divina apavoram-me. Neste momento, entreguei com Jesus o meu espírito. Passaram-se uns bons minutos nesta morte total. Jesus veio ressuscitado, ressuscitou-me também.

— “Apressai-vos, apressai-vos a consolar o Coração Divino de Jesus e o Coração Imaculado da Sua Bendita Mãe. Apressai-vos, apressai-vos a reparar a justiça de Deus ultrajada. Escutai, escutai, fala-vos Jesus, fala-vos o Senhor. Amai-Me, amai-Me, fazei com que Eu seja amado. Quem ama dá-se, quem se dá aceita tudo. Eu quero receber, Eu quero receber, Eu quero dar, Eu quero dar, Eu quero dar-Me. Quero dar, dar muito, dar sempre às almas reparadoras. Quero dar-Me, dar-Me inteiramente à almas que Me quiserem possuir. Escutai, fala-vos Jesus, no coração e pelos lábios da vítima deste Calvário. É sublime, sublime, mas árdua a sua missão. Ajudai-a, amparai-a, mãos à obra. Minha filha, minha querida filha, farol luminoso, sol que brilha e penetra, tem coragem, tem coragem. A tua reparação sustenta o braço do Meu Eterno Pai. A tua dor faz almas reparadoras. Eu quero, sim, Eu quero almas vítimas, almas imoladas, dia e noite, almas heróicas, que provem, com o seu heroísmo, que querem a Jesus, que O amam e Lhe querem dar as almas. Coragem, coragem, minha filha, filha predilecta do Senhor, pomba branca, florinha eucarística. A hora é grave, a hora é grave. Ou há reparação, reparação constante, ou cai sobre a terra, e cai sem remédio, a foice, a justiça vingadora do Eterno Pai.

— Ó Jesus, ó Jesus, o meu peito rasga-se. A minha alma vê, como que a rasgarem-se, as nuvens do firmamento. Não posso, meu Deus, não posso, Senhor. O meu peito rasga-se, a justiça esmaga-me. Que pavor, que pavor, meu Jesus, toda a terra se envolve na Vossa justiça ou na justiça do Vosso Pai. Perdoai, Jesus, perdoai, Eterno Pai. Pelos méritos da Paixão e Morte de Jesus Cristo. Perdão, Jesus, perdão, Pai Eterno, perdão e misericórdia para o mundo. Ó meu Deus, ó meu Deus, eu sou a Vossa vítima. Quero ser esmagada, sim, meu Jesus, mas quero que ao mundo seja poupada a ira do Senhor. Eu quero ser esmagada, sempre imolada, sempre imolada, mas nunca, Jesus, o Vosso Divino Coração ferido, nem O de Vossa Bendita Mãe.

— “Minha filha, minha filha, minha querida filha, alegria no Céu, escora da justiça divina, se os sábios da Santa Igreja estudassem e compreendessem bem a missão que o Senhor te escolheu, a reparação que em todo o sentido da palavra que por ti é dada ao Altíssimo, não contradiziam, não se opunham à minha vontade divina. Tudo o que em ti se passa, todas as maravilhas divinas, que em ti opero, são uma lição para o mundo, é uma lição para os que mais sabem, para os que mais lêem, para os que mais compreendem. É um complexo da vida de Cristo, da vida reparadora de Cristo, da vida redentora de Cristo. Haja reparação, faça-se penitência, muita penitência. Vida nova, vida nova, mundo novo. Vem, minha filha, receber a gota do Meu Divino Sangue. Uni ao tubo doirado os nossos corações. Passou a gotinha do sangue, passou a vida de que tu vives, minha filha”.

— Ó Jesus, o meu coração parece um sopro, está mais leve que a pena. Não tem asas e parece que voa. Voa convosco, voa com a Vossa vida, voa com o Vosso amor. A gotinha do Vosso sangue retirou de mim todo o peso esmagador. Estou mais forte, Jesus, muito obrigada. Lembro-Vos, meu Amor, todos, todos os que me são queridos, todos, todos os que se me recomendam ou querem recomendar às minhas pobres orações. Lembro-Vos, meu Jesus, a humanidade inteira. Perdoai-lhe, Jesus, perdoai, compadecei-Vos dela. Compadecei-Vos de mim e perdoai-me os meus muitos pecados.

— “Fica na cruz, minha filha, fica nesta cruz dolorosa, é cruz de triunfo, é cruz de milhões, milhões, milhões de almas que se salvam. Coragem, coragem”.

— Obrigada, meu Jesus. Obrigada, meu Senhor.

   

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