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SENTIMENTOS DA ALMA

1952

NOVEMBRO

1 de Novembro – Primeiro Sábado

Esperei a vinda do meu Jesus numa ansiedade e ao mesmo tempo numa indiferença indizível. Queria unir-me a Ele pela Eucaristia, numa união inseparável, mas não sei o que me tinha alheia e me tornava inútil a tudo. Queria voar ao encontro do meu Amado, queria preparar-me para O receber dignamente. A inutilidade cortava-me todos os voos, absorvia em si todas as ânsias, deixando-me abismada no abismo do meu nada. Jesus chegou, entrou no meu coração, iluminou-me toda a casa, encheu-me d’Ele e falou-me assim [1] :

— “Minha filha, vem comigo, transporta-te ao Paraíso, repara nesta massa compacta de santos e santas que, neste dia, mais do que em nenhum outro, jubilosos, num hino deslumbrante, bendizem o Senhor seu Deus, louvam toda a Santíssima Trindade e a sua Celeste Rainha”.

— Ó Jesus, ó Jesus, aqui queria ficar também, nesta paz, neste mergulhar de amor, neste fogo que inebria. Como eles, eu queria amar-Vos, como eles eu queria entoar hinos de louvor, hinos de reparação, hinos de agradecimento. O que é o Céu, Jesus, o que é o Céu ! Ah ! Se todos soubessem o que é gozar o Paraíso ! Que amor, que amor, que paz, que celeste paz ! Toques, cânticos, hinos maviosos. O que é o Céu, Jesus ! Amor, só amor. Sois Vós, só Vós com o Vosso Pai e o Espírito Santo, espírito de amor.

— “Minha filha, minha querida filha, tudo está reservado para ti, espera-te para breve. Confia, confia. Sê sempre fiel e heroína como até aqui. Dá tudo ao teu Jesus. Repara, repara sempre, nada Lhe negues. Diz ao teu Paizinho que os eleitos do Senhor o esperam. Ele será contado entre eles ; como os Meus santos, ele será honrado na terra; como eles, subirá às honras dos altares. Reparo-o para isso pelo sofrimento. Escolhi-o para luz e guia das almas, missão difícil e espinhosa, missão que exige a maior perfeição e sabedoria; missão que exige a ciência das coisas divinas. Diz-lhe que o Senhor é fidelíssimo, não falta ao que promete. Diz-lhe que as nuvens se dissiparam, o sol apareceu, brilhou. Dá-lhe todo o meu amor, todo o amor da Trindade Divina e da minha Bendita Mãe. Dá-lhe paz, paz, toda a minha paz. Diz, diz ao teu médico que o tenho no meu Divino Coração, como jóia do mais elevado valor. Diz-lhe que o amo tanto, tanto, que as cadeias do meu amor o prendem, dia a dia, mais e mais ao meu. Diz-lhe que o cadinho da dor é para purificar a sua alma; que é o cadinho que purifica o ouro das suas virtudes. Diz-lhe que tudo quanto faço nele e no seu formoso jardim são provas de amor e de predilecção, são cuidados inauditos do jardineiro divino. Eu não quero, Eu não quero, atenção, que nenhuma das suas florinhas se perca, que nenhuma se manche. Eu velo, Eu velo, mas quero sempre a fidelidade à minha divina graça. Dá-lhe todo o meu amor divino. Diz-lhe que com ele se fortaleça, para com ele, como sempre, cuidar e defender a minha divina causa. Vem, Mãe Bendita, vem consolar a Nossa filhinha”.

— Ó Mãezinha, ó Mãezinha do Carmo, muito obrigada por me dares a beijar o Jesus pequenino que trazeis nos Vossos braços. Ele, tão pequenino, beija-me e acaricia-me. Como são ternas as Suas carícias, como é doce o Seu sorriso. Quer vir para mim e eu quero ir para Ele; é Jesus, é a Mãezinha, os três num só.

— “Minha filha, minha querida filha, depois deste celeste conforto, venho pedir-te que neste mês ofereças tudo, sofras tudo e faças que muitas almas te imitem. Tudo pelos pecadores, para que não caiam no inferno. Mas mais, muito mais, pelos sacerdotes que tanto ofendem ao Senhor, que tanto ferem o Coração do Meu Jesus e o Meu, e em sufrágio das benditas almas do purgatório, para que elas subam em cada momento para o Paraíso, aos bandos, aos bandos, como as andorinhas. Minha filha, minha querida filha, vai em paz, leva a paz de Jesus e de Maria, leva o amor dos Nossos Divinos Corações. Via, vai, minha filha, e não esqueças a recomendação da tua e Minha Mãe celeste. Acode, acode aos pecadores. Aliviai, aliviai as almas do purgatório. Leva tudo para os que amas e são teus, leva tudo para quem quiseres, tudo o que é Nosso, tudo o que é do Céu”.

— Ó Jesus, ó Mãezinha, muito obrigada. Vede o que agora está no meu coração, o que eu quero e que Vos peço. Confio em Vós, confio em Vós.

— “Confia, confia, pede e confia. Jesus e Maria velam os teus interesses, velam por quem Lhes pertence”.

— Obrigada, Jesus, obrigada, Mãezinha.

5 de Novembro – Sexta-feira

Sou a criatura mais pobre e miserável. Sinto que o Senhor não pode ter um olhar de misericórdia para mim, podridão de todo o meu ser, causada por todos e vícios e crimes. Enoja o Céu, Jesus não pode olhar-me, o Eterno Pai não pode perdoar-me. Toda a humanidade é por mim contaminada. Morrem na podridão todos os que seguem os meus caminhos e pisam as minhas pisadas. A humanidade segue-me, perde-se comigo, as almas fogem do Senhor. Quero firmar-me e não posso, a terra foge-me de debaixo dos pés como areia arrastada pelas ondas para o fundo do mar. Estou perdida, meu Deus, estou perdida, e comigo se perdeu o mundo inteiro. Que contas posso eu dar ao meu Senhor? Que pavor na minha alma! Ela fita os olhos no Céu e vê-o com as nuvens mais negras e carregadas. Sente que a terra inteira é um mar das mais agitadas ondas. Ando enredada nelas, como folhas que o vento dissipou e já na lágrima apodreceu. Tudo isto se acentuou no meu nada. Tudo isto aparece naquilo que eu não sou, porque, porque não existo. Só a dor, aquela dor, que é tão grande como Deus, é infinita, feriu e fere dia a noite; a cada momento, o Coração Divino de Jesus se colocou no meu coração, metendo-o todo em si, para eu sentir como Jesus sente, agonizar como Ele agoniza. Ó Céu, ó Céu, vem em meu auxílio. Sem a Vossa graça, Jesus e Mãezinha, eu não poderei sofrer tanto, não resisto a toda esta dor infinita. Eu queria, eu tenho necessidade que até as pedras falem, que todas as coisas, que pregam o seu autor, declarem como Deus é grande, como Ele ama, e o que é uma ofensa contra a majestade divina. Sou ignorante, por mim não sei dizê-lo, sou inútil, não posso por mim reparar. Meu Deus, o que eu sofro ! O meu coração e a minha alma estão em sangue, é um cedeiro de espinhos a trespassá-los, é um mundo de punhais a cravá-los. Quero luz, quero um apelo, quero um guia, não tenho, estou do Céu e da terra de todo abandonada. Quero firmar-me e não posso; todas as escoras, a que me amarro, me falham. Desfaleci, caí, caí, morri. Que morte tão cruel. Tudo é pavor para mim. A lembrança das quintas-feiras, porque me trazem as sextas, a aproximação do Horto, é tormento indizível. O de ontem aproximava-se, e eu indiferente tentei sempre fugir. Fora, de mim, fora da minha vida, não sei como fiquei a agonizar prostrada naquele solo duro. Agonizei e suei sangue, porque as cordas se me ataram ao pescoço, para por elas ser arrastada, e a cruz me sobrecarregou sobre os ombros, para com ela toda a humanidade me esmagar. De tudo fugi e para tudo fui inútil. Nesta manhã, fugi para o Calvário ; levava-me a força divina, a força humana não resistia. As quedas eram frequentes. Por cima de mim, a minha alma viu Jesus de braços abertos, pregado na cruz. A Sua graça O levava sem esta tocar na terra. Era cruz de triunfo que brilhava mais que o sol. E eu, vermezinho da terra, levava a minha com o coração a sangrar, a cabeça coroada de espinhos, sob o peso duma montanha mundial, feita em rocha mais endurecida. Caminhava sem ser eu ; levava a cruz com todo o seu peso, com forças alheias, que eram as de Jesus. Dizer o que eu sou e o que é Jesus, dizer o que foi esta viagem e o que era a minha miséria e a grandeza do Senhor, é impossível. Falai, Anjos, falai por mim. Cheguei ao Calvário e então uni-me a Jesus, parecendo que se abraçou o Céu com a terra. Os meus olhos moviam-se com Os de Jesus. O meu coração palpitava e bradava com Jesus. Fez-se noite. Toda a terra tremeu e eu expirei com Jesus. De novo, voltei à vida. Foi Ele quem ma deu e falou-me assim :

— “Todo o palácio de Jesus é luz. Todo o teu coração, minha filha, é amor, só amor. Sentei-Me no Meu trono, depois de iluminar toda a minha habitação com a luz divina. Estou aqui como um rei. Em ti reino, em ti triunfo. Estou no teu coração para amar e por ti ser amado. Estou no teu coração para por ti ser dado às almas. Estou no teu coração, para que vivas a minha vida e a faças viver em muitas e muitas almas. Tenho sede, minha filha, muita sede. Quero beber nos corações e neles quero habitar. Minha filha, minha filha, a dor é cadeia de amor. A dor, a dor, atrai o Meu Divino Coração, leva-O à compaixão pelos pobres pecadores. Sou Senhor, sou Pai, quero perdoar. Ó minha filha, minha filha, os meus súbditos não querem que Eu reine sobre eles. Os meus filhos não aceitam o meu perdão. Ando à busca de alojamento. Quero alojar-me, quero descansar nos corações. Há tão poucos, tão poucos onde Eu possa entrar e descansar !... Há tão poucos, tão poucos, quase nenhum onde Eu encontro as minhas verdadeiras delícias !... Sofre, sofre, minha filha, sofre, florinha eucarística. Sofre, vítima deste Calvário, semelhante à vítima do Calvário de há vinte séculos”.

— Ó Jesus, ó Jesus, ensinai-me a sofrer. Ensinai-me a reparar. Fazei que eu me entregue a Vós, como Vós Vos entregastes ao Eterno Pai. Ó Jesus, ó Jesus, não sei onde está o meu amor. Ofendo-Vos tanto, tanto! Estou sempre a cair. Nada valem os meus propósitos.

— “Minha filha, minha filha, sou sol, graça e amor. És sal para o mundo, porque em ti está o Sol divino. És luz para as almas, porque em ti está a luz do Senhor. És graça, porque possuis a graça e com ela dás a graça a muitos, muitos pecadores. És amor, porque amas com o amor de Jesus. És amor, e por ti muitos corações Me amam. Sofre, sofre; é pouco este amor. É muito nos corações, é pouco para Deus. Sofre, sofre. Criei-te para a dor, criei-te para o Calvário. Criei-te para seres a cópia fiel de Cristo crucificado. Tem coragem, minha filha, Eu permito as tuas faltas. Depois delas, levantas-te mais fortemente para Mim. São elas umas sombrazinhas que encobrem os tesouros divinos em ti encerrados. O amor de Jesus queima-te, abrasa-te, consome-te. Eu quero que sejas, minha filha, o cadinho de purificação. O mundo, o mundo, as almas, hão-de purificar-se neste caminho de sofrimento, o qual fogo é amor, amor, só amor de Jesus. Vem, minha filha, receber a gota do meu divino Sangue. Uniram-se os corações das duas vítimas, Jesus e o da Sua esposa amada. Passou o sangue que dá a vida, a vida de que tu vives, a vida que Jesus te faz viver. Passou o sangue que é o teu alimento e a força da tua cruz. O mundo, o mundo, não conhece. Ah ! Se conhecesse ! Não conhece o meio de salvação. O mundo, o mundo, não se aproveita das graças do seu Senhor. Fica na cruz, minha filha, minha esposa amada, crucificada, bem unida a ela pelos laços do amor. Brada, brada sempre à pobre e infeliz humanidade: Jesus chama-te, Jesus pede-te, não peques mais, vem ao Seu divino Coração. Vai em paz, minha filha, vai em paz. Brada, brada, pede sempre oração, penitência e emenda de vida”.

— Ó Jesus, eu vou, ou melhor, eu fico, fico convosco, mesmo sem Vos sentir, mas, enquanto que Vos sinto, enquanto que sinto o Vosso amor, em nome dele Vos peço, lembrai-Vos dos que me são queridos, lembrai-Vos das minhas muitas e grandes intenções. Lembrai-Vos e compadecei-Vos do mundo inteiro. Obrigada, meu Jesus, obrigada, meu Amor.

14 de Novembro – Sexta-feira

Meu Deus, que martírio tão grande eu sinto no corpo e na alma ! E eu ter que queixar-me, ter que dizer que sofro muito, que não posso, aumenta-mo mais, muito mais ainda. Só Vós sabeis, Jesus, quanto me custa manifestar aquilo que de todo queria esconder. Tenho que obedecer e, nesta obediência, tenho que dizer a verdade. Sofro, sofro tanto, são triturantes as agonias da minha alma, e um martírio contínuo o sofrimento do meu corpo. É só por Jesus e pelas almas que eu aceito esta imolação. Vejo tudo perdido, sinto como se de nada me aproveitasse o meu sofrimento; mas não me importo, o que eu quero é agradar e consolar o meu Senhor. Ele é que é a minha força, Ele é que vive a minha vida de indizível sofrimento. No domingo passado, na noite de nove para dez, quando eu no meio das minhas dores procurava estar unida a Jesus na Eucaristia, dar-Lhe o incenso e a mirra do meu martírio, ser a mesma Hóstia com Ele, inesperadamente travou-se em mim uma luta tremenda e desesperadora. Eu ofendia o meu Jesus com a maior malícia e gravidade. Era uma maldade que preenchia o mundo. Mas esta era toda minha. Fiquei no inferno. Ó meu Deus, que pavor ! Vi e compreendi o que nunca tinha visto, nem compreendido. Os demónios eram tantos, tantos, não tinham conta. Estavam armados de instrumentos que feriam e atormentavam. As labaredas do negro fogo eram ateadoras. As almas, meu Deus, as almas eram como moinha, eram como um formigueiro amontoadas. Vi o que nunca tinha visto, vi e compreendi o que nunca tinha compreendido. Isto é, vi um Papa e a sua cadeira, vi muitos Bispos, com as suas vestes e o báculo nas mãos, vi sacerdotes em grande número e almas sem conta de toda a classe e condição. Compreendi claramente as razões por que tinham sido condenadas. Meu Deus, meu Deus ! Não chamei por Jesus nem pela Mãezinha, não sei por quê. Fiquei perdida naquele pavor. A visão desapareceu, porém aqueles sentimentos não havia forma de me deixar sossegar. A pouco e pouco lá me fui unindo novamente a Jesus e pude, embora por pouco tempo, adormecer. Tudo isto está tão gravado em mim, parece que jamais se poderá apagar. Na quarta-feira já me apavorava a aproximação da quinta e da sexta-feira. Era tal a minha miséria que eu sentia a necessidade de esconder-me dos olhares do Senhor e fugir aos colóquios com Jesus. Ontem, passei o dia na minha inutilidade, sem querer, recordando o Horto, mas fugindo-lhe sempre. Era já de noite, e eu senti como que se a minha cabeça estivesse coroada dos mais penetrantes espinhos, e o sangue a correr-me dela com toda a abundância. Foi então que as veias se me rasgaram, e eu banhei a terra com sangue. Eu envolvia-me em toda a terra mundial, nela me rolava em ondas pavorosas de crimes. É terrível o abandono do Céu, quando da terra já me parece não ter ninguém por mim. Hoje, num mar infinito de dor, caminhou para o Calvário o meu coração. Alguém o levou. Era o amor ligado ao Amor Supremo. Eu por mim fugi-lhe, fugi-lhe sempre na minha inutilidade, grande como o mundo. Quando Jesus já estava no Calvário, a despirem-nO para o crucificarem, Ele atraiu-me, chamou por mim que estava ao longe, o mais ao longe que se pode imaginar : “Vem cá, minha filha, vem assemelhar-te a Mim, vem comigo ser crucificada”. Juntei-me a Jesus, e, ao mesmo tempo que estava crucificada com Ele, foi uma contínua revolta. A minha maldade era mundial. Dei-Lhe todos os maus-tratos. Fazia-O bradar e bradava com Ele. Senti como se fosse eu que pus toda a humanidade de lança em punho para O alcançar e atravessar o Coração. Dei-Lhe a morte e morri com Ele. Após algum tempo, a esta cena dolorosa, Ele veio, entrou no meu coração, fê-lo viver com Ele e falou-me assim :

— “Minha filha, minha filha, estou aqui, escuta-Me, atende-Me. Estou no teu coração, porque é aqui a minha morada. Escuta-Me, atende-Me, sou o mendigo de sempre. O meu Divino coração ama, ama infinitamente. Amo infinitamente e infinitamente sofro. Atende-Me, atende-Me, dá a esmola ao Mendigo. É o Mendigo dos mendigos, é o Senhor do Céu e da terra, é o Mendigo divino. Deixa-Me, deixa-Me dizer mais ; sou o Pai de toda a humanidade. Oh ! Como é terna a palavra de Pai. Sou todo, sou todo amor para os corações. Sou Pai que ama, como nenhum outro pai. E o meu divino amor é calcado aos pés, é desprezado, é odiado, é perseguido. Dá-Me a tua dor, minha filha, dá-Me a tua dor. É o Pai que pede a esmola à Sua filhinha. É o esposo a manifestar-se claramente à Sua esposa amada. Eu quero, minha filha, Eu quero a tua dor, porque o mundo a quer e de Mim a exige. É urgente, é mais que urgente, aplacar a justiça irada do Meu Eterno Pai. Minha filha, minha filha, Jesus fala no teu coração, reina neste trono de delícias, Jesus pede neste coração que sangra dia e noite. Sangra, sim, sangra, minha filha, o teu coração, para que não sangre o Meu. Não posso sofrer sozinho, sofro em ti misticamente”.

— Ó meu Jesus, ó meu Jesus, eu sei, oh, bem sei, meu Amor, que sois Vós, só Vós, a sofrer, que ainda sois Vós hoje como outrora no Calvário a serdes crucificado. Eu sei, meu Senhor, que por mim nada mais podia sofrer e nada teria sofrido. Eu sei, meu Sumo bem, que sou capaz de Vos negar tudo, se não estivesse sempre o Vosso sim no meu coração e nos meus lábios. Meu Jesus, meu Jesus, olhai para a minha miséria e compadecei-Vos dela. Olhai para a minha fraqueza e fortalecei-me com a Vossa força. Vede a minha inutilidade. Fazei úteis todos, todos os meus sofrimentos. São pelo Vosso amor, são para a salvação das almas.

— “Minha filha, ó florinha eucarística, florinha do Rei dos sacrários, do Rei da terra, do Rei da glória. Eu vejo, Eu vejo tudo em ti. Só mergulhada assim no teu nada e nesse abismo de miséria, tu podias ser depositária dos tesouros infinitos do Senhor. Tu és a cópia fiel de Cristo Senhor. Tu reparas por todos, todos os pecados do mundo. Ó minha filha, minha filha, escora mundial. Tu reparas, tu desagravas pelo mundo inteiro. Ai dele, ai dele !... Ai dele, pobre dele, se não fora a escora deste calvário. Tem coragem, tem coragem ! Tu és luz nas tuas trevas, tu és amor na tua frieza. És útil na tua inutilidade. És vida na tua morte. Eu peço, Eu peço. Ah! Se os homens compreendessem o que Eu peço! Eu peço e tudo podia fazer. Eu peço e só Eu podia manifestar o meu poder. Eu peço para não humilhar. Eu peço para chamar. Vem, minha filha, vem receber a gota do meu Divino Sangue. São tantos, tantos os Anjos a contemplar esta maravilha do Senhor! Uniram-se os nossos corações pelo amor, pela dor, pela vida. Passou a gotinha do sangue divino. Passou o teu alimento. Passou a vida da graça. Passou a força, o poder para a dor. Fica na cruz, minha pomba bela. Nela, sempre nela. Brada ao mundo : oração, penitência, emenda de vida. Nela, sempre nela, conquista para Mim as almas. Atrai-as ao meu Divino Coração. Diz ao mundo que o Senhor quer almas vítimas, o Senhor quer almas justas. Vai em paz, minha filha. Vai em paz. Coragem, coragem !”

— Obrigada, meu Jesus. Sede no meu coração. Atendei a tudo o que nele está escrito. Obrigada, meu Amor.

21 de Novembro – Sexta-feira

Não posso, hoje, não posso ditar. Digo só umas palavrinhas com as quais provo a minha obediência. O meu corpo é um mundo de dor. De toda a parte me vêm espinhos a avivar todo o meu ser ferido, todo o meu ser em sangue. Não posso dizer que sou eu que sofro. Se o dissesse, mentia e eu não quero mentir. Odeio a mentira. É Jesus que sofre em mim, porque, se fosse eu a sofrer, tinha desesperado, Jesus, sem conta. Nem ao menos sei oferecer a Jesus este mundo de sofrimento que me leva à dor infinita. Até nisto há a inutilidade. Jesus, eu Vos ofereço o incenso dos meus louvores pela cruz que me dais, e a mirra de toda a mortificação. Aceitai tudo unido aos Vossos méritos e apresentai ao Eterno Pai. Sou a Sua e Vossa vítima. A inutilidade mete-se em tudo. Surge-me de todos os caminhos. Foi inútil todo o meu dia de ontem. Foi-me indiferente o pensamento do Horto. Era já de noite; transportada lá sem saber como nem por quem, senti todo o meu corpo despedaçado, fui açoitada e coroada de espinhos cruelmente. Os algozes empurravam-me e arrastavam-me, quando sobre os ombros eu levava a cruz. As chagas abriam-se mais; o sangue regava toda a terra. Apoderou-se de mim o pavor. Senti o abandono do Eterno Pai, apesar de virem do alto uns raios que pendiam d’Ele e em mim se comunicavam e infundiam. Era a Sua vida divina. Nestes sentimentos de dor e pavor e ao mesmo tempo de inutilidade, eu segui para o Calvário e fiquei crucificada na cruz. Não sei quem fazia que os cravos andassem dentro e fora, avivando-me assim as chagas, que eram as chagas de Jesus. Parecia-me que era eu com os meus pecados que fazia tudo isto. Revoltava-me e crucificava-me a mim mesma. Feria-me tanto o brado agonioso de Jesus! Derretia-me o coração em dor! Ele entregou-se, expirou o eu com Ele. Fiz a minha oferta, entreguei o meu espírito. Jesus foi pronto a fazer-me viver. Novamente fez luz no meu coração, inundou-me na Sua doce paz e disse-me :

— “Ouvi, escutai ! Jesus vai falar, vai dizer quanto sofre o Seu Divino Coração. Ouvi e atendei, Jesus vai pedir a Sua esmola de sempre. O mundo, o mundo, minha filha, fere, calca aos pés o meu Coração divino, o meu Coração de Pai. São tantas as lançadas, são tantos os pés cruéis que Me esmagam. As almas, as almas, os pecadores !... Que estragos causam no mundo ! Como eles provocam a ira de meu Pai ! Como eles desafiam a Sua justiça ! Vem, vem, minha filha, florinha eucarística, luz e farol do mundo, vem consolar o meu Divino Coração, vem com o bálsamo das tuas virtudes, dos teus sofrimentos, curar as chagas do meu Coração que tanto sangra. Vem, minha filha, e faz que venham a Mim muitas almas, muitos corações. Tenho sede, sede devoradora. Tenho ânsias, ânsias de dar-Me, dar-Me inteiramente”.

— Ó Jesus, ó Jesus, não descanseis; dai-Vos, dai-Vos todo a mim. Dai-Vos todo às almas que Vos buscam, que Vos querem, que por Vós suspiram. Não olheis para mim, para a minha miséria. Eu não sou digna de nada Vos pedir, de nada Vos receber. Mas tenho ânsias, também tenho muitas ânsias. Queria-Vos ver reinar em todos os corações. Não queria, não, meu Jesus, que houvesse um só que Vos desprezasse, que Vos ofendesse. Se eu pudesse, ó Jesus, correr o mundo e soubesse falar de Vós ! Como eu gostava de falar às almas do Vosso amor ! Como eu gostava que todos compreendessem o que é uma ofensa feita ao Vosso Divino Coração ! Pobre de mim, Jesus! Sou ignorante, sou inútil. Nada sei dizer, nada posso fazer !

— “Minha filha, minha filha, íman atraente. Tu não corres o mundo, mas corre a tua vida o mundo. Tu pregas com o teu sofrimento, com o teu exemplo. És a missionária querida do Altíssimo. É no teu leito de dor que és missionária como tanto ansiavas. Coragem, minha filha, coragem ! Coragem, crucificada mais imitadora de Jesus, do Cristo do Gólgota. A tua vida, a tua vida o exemplo de Jesus Cristo ! Assemelhei-te em tudo a Mim. Fala, fala às almas que vêm junto de ti. Foi a missão nobre, nobilíssima a que te escolhi! Nenhuma delas volta como vem para aqui, mesmo as mais criminosas e endurecidas. É por ti que Eu me estou a dar. É por ti que Eu me comunico aos corações. Vem, minha filha, vem receber a gota do meu Divino Sangue, vida e alimento divinos. Vives a vida de Jesus. Vives com o sangue e a carne de Jesus. Oh ! Maravilha ! Oh ! Maravilha extasiante ! Os Anjos estão em torno. Desceram do Céu, desceram aos bandos. Rodeiam o teu coração, como rodeiam o sacrário. Como são belos os corações e as almas nas quais habita o Senhor! Minha filha, minha filha, estou no teu coração, delicio-me nele e nele esqueço os crimes da humanidade. O teu sofrimento salva milhões, milhões, milhões de pecadores. O teu sofrimento é escora firme, escora do meu Eterno Pai. Avisa, avisa o mundo. Se ele não arrepia caminho, as escoras do Senhor deixam de ser escoras, e o braço vingador cai, cai com toda a Sua justiça, cai sem remédio; pede, minha filha, pede-Me sempre perdão para os pecadores. Eu não Me importa a tua inutilidade, quero que tu os ofereças. Oferece-Ma também. Tudo é útil, tudo é poderoso, tudo é salvação com teu Senhor”.

— Ó meu Jesus, meu Jesus, é neste momento, e quero que seja a todos os momentos do dia e da noite, que eu Vos peço pelas minhas grandes intenções, por todos quantos me são queridos e me pertencem, por todos quantos querem as minas pobres orações, e pela humanidade inteira, meu Jesus. Perdão e misericórdia, perdão e misericórdia, perdão e misericórdia para mim, Jesus, e para todos os filhos Vossos.

— “Vai em paz, minha filha! Muita coragem e confiança ! O Senhor está contigo, em ti habita. Fica na cruz e nela crucificada pede oração, penitência, emenda de vida”.

— Obrigada, Jesus, obrigada. Custa-me tanto separar-me de Vós! Valei-me sempre! Sede a minha força.

28 de Novembro – Sexta-feira

Continuo a não poder ditar o muito que me vai na alma, que se resume ao nada, por ser grande a minha ignorância. Jesus não larga a prensa da dor, espreme, aperta dia e noite, aperta sempre e só com Ele assim se pode sofrer. Quanto mais intensa é a dor, mais íntima é a minha união com Ele. O incenso de louvor, a mirra da mortificação é contínua a subir ao Céu. A inutilidade apresenta-se logo, ou melhor, presente sempre, rouba-me tudo, nem ao menos me deixa ver um rastilhozinho, como fumo que desaparece. De mãos vazias, sem nada, nada para o meu Senhor, num completo abandono da terra e do Céu. Eu chego, ó meu Deus, a dizer quantas vezes a mim mesma, inesperadamente, mas sem eu querer. Mas eu vivo. O mundo existe e existe o Céu. Estremeço com estes sentimentos de abandono e com estas perguntas que não sei de onde vêm. Sim, Jesus, eu vivo pela Vossa graça. Existe o mundo e eu não sou por todas as criaturas abandonada. Existe o Céu, porque Vós existis e Vós não abandonais nenhum dos filhos Vossos. Creio, creio, creio e confio. Jesus, sou a Vossa vítima. A última proibição, que houve no meu caso, já não há. Depressa acabou. Se fosse assim a primeira que tive, que foi a proibição do meu pai espiritual, já há quase dez anos. Louvado seja o Senhor. Foi no Domingo que eu soube que a última proibição estava novamente na mesma, que tudo poderia seguir como antes, e eu que não mais pensasse nisso. Foi um peso que saiu de mim, que tanto me oprimia. Ah ! Se todos assim compreendessem e zelassem o bom nome do seu semelhante !... Eu não sabia, nem sei, como agradecer ao Senhor. Pedi à Mãezinha que suprisse a minha falta, agradecendo-lhe por mim. Esta boa nova foi como que uma injecção a fortificar-me a alma. Como mais nada sabia dizer, repetia o meu eterno obrigada a Jesus e sempre a minha oferta de vítima. Depressa o conforto desapareceu e eu voltei para a mesma noite, para a mesma vida duvidosa, para o jugo do meu Calvário. Ontem, desejava que as quintas-feiras desaparecessem, apavorada pelos sofrimentos do Horto. Fugi-lhe, fugi-lhe sempre, como louca perdida. Já de noite, muito de noite, eu fiquei naquele solo duro, espavorida, sem ter ninguém que pudesse valer-me. Por todos os lados, ou melhor, por caminhos sem conta, surgiam feras nos rebanhos a atirarem-se a mim. Nem do Céu me vinha a defesa, nem de lá o conforto. As veias rasgaram-se-me, e o sangue banhou a terra. Durante a noite, acompanhei a Jesus o melhor que pude. Nesta manhã, não segui para o Calvário com Jesus, deixei-O sozinho. Eu fiquei numa noite pavorosa, numa agonia e dor de alma indizíveis. Os meus lábios não se abriam para desabafar. Eram interiores as minhas queixas, o meu desabafo. Não sei quem me levou ao encontro de Jesus, quase no cimo da montanha. Ali, unida à Mãe, senti no meu coração o ofegar e palpitar d’Ele; batia no meu coração como que uma enxurrada saída dos Seus divinos lábios em golfadas fortíssimas de sangue. É indizível a minha dor com estes sentimentos. Jesus estava moribundo. Fui eu crucificá-Lo, a dar-Lhe a morte. Nas horas da agonia senti sempre as afrontas feitas ao Senhor, apesar de ser eu quem Lhas dava. Eu era a humanidade revoltada contra Jesus a dilacerar-Lhe as carnes, a rasgar-Lhe o peito e a abrir-Lhe o coração. Neste momento, Ele deu o Seu Divino Sangue e expirou. Expirei com Ele e, um pouco mais tarde, por Ele ressuscitada, ouvi a Sua voz divina :

— “É grande, muito grande, infinitamente grande, a misericórdia do Senhor. É séria, infinitamente séria, a Sua justiça. É a misericórdia infinita e seriedade infinita. Reparai, reparai. Estai bem atentos, Jesus perdoa. O Senhor quer perdoar. O Senhor quer o vosso arrependimento. Jesus há-de vir julgar-vos. Alerta, alerta. Avisa-vos o Senhor. Não pequeis, não pequeis. É séria, e muito séria, a justiça do Senhor”.

— Não posso ver, Jesus. Não Vos deixeis cair por terra. Caí sobre os meus braços, meu Amor. Eu sou indigna de neles Vos possuir, mas não olheis para isso, Jesus. Não posso ver o Vosso rosto conspurcado em terra. Deixai que eu Vos abrace e Vos estreite ao meu pobre coração. Quero amar-Vos, Jesus, quero amar-Vos por todos. Quero reparar-Vos por todos os pecados e crimes. Caiam sobre mim, meu Jesus, todos esses braços cruéis de armas e punhais em punho e tantos instrumentos que ferem.

— “Minha filha, minha querida filha, com a minha santíssima cabeça inclinada sobre o teu coração, quero acabar este colóquio. Já é sobre ti, minha filha, sobre o teu débil corpo que Eu permito que sejam descarregados tantos e tantos açoites, tantos e tantos sofrimentos. É sobre ti, minha filha, florinha eucarística. É sobre ti e não sobre mim, porque és a minha vítima. Sabes, minha esposa querida, o que tudo isto representa? Os pecadores, os pecadores de todas as classes e condições. Eu chamo-os por eles e por ti lhes dou o perdão. Os teus sofrimentos, o teu calvário levam-nos ao arrependimento, levam-nos a uma confissão bem feita. Confia, confia, filha querida. Se assim não sofresses, eles não iam aos bandos ao tribunal da penitência. A dor, ligada ao amor, é a arma mais poderosa, é a escora mais firme que sustenta o braço do Senhor. Escutai, escutai ! Estai atentos, que o eco de Jesus pelos lábios da Sua vítima ecoa no mundo inteiro : oração, penitência, emenda de vida. Falem os que podem falar, avisem os que podem avisar. Alerta, alerta, todos os filhos do Senhor. Ele vos chama, arrepiai caminho. Escutai, escutai. O aviso vem do Céu. Atendei, atendei a Jesus que está chamando. Vinde, meus filhos, vinde meus filhos, vinde meus filhos ao meu Divino Coração. Porque me feres assim ?... Sou o vosso Pai. Amai-Me, porque Eu vos amo. Vinde a Mim, porque morri por vós”.

 Ó Jesus, ó Jesus, porque chorais assim ? Deixai para mim as Vossas lágrimas. Eu não Vo-las posso enxugar !... Nem tenho com quê, meu Amor.

— “Choro, choro, minha filha, porque chamo os filhos meus e eles fogem, não me atendem, não vêm a Mim. Choro, choro, porque correm loucos para o inferno. Querem perder-se eternamente”.

— Não choreis mais, Jesus. Aceitai o meu frio amor, o meu pobre coração cheio de ânsias de Vos amar e por todos Vos reparar. Estou disposta, Jesus, a sofrer tudo, tudo, todas as humilhações, todas as calúnias, todos os sofrimentos que Vos aprouver dar-me. Não choreis, não choreis mais. Quero chorar eu sempre as Vossas lágrimas.

— “Já não choro, minha filha. Repara bem em Mim. O teu amor, a tua generosidade foi o suficiente para mas secar. Vem em troca receber a gota do meu Divino Sangue. Bem unidinhos os nossos corações, passou a gotinha de sangue, o alimento que te faz viver. Vive de Cristo. Esta gota de sangue divino leva em si todas as riquezas divinas. É por ti que toda esta riqueza infinita transparece e passa para as almas. Fica na cruz, esposa minha. Fica na cruz, luz e farol do mundo. Fica na cruz, escora do meu Eterno Pai, escora da Sua justiça, escora do Seu braço vingador. Sofre, sofre com alegria e não cesses de dizer às almas : vinde a Jesus, vinde a Jesus”.

— Antes de sairdes dos meus braços, meu Amor, quero lembrar-Vos, como sempre, todos os que me são queridos, toda a minha família, todos quantos pedem as minhas pobres orações, amigos e inimigos, o mundo inteiro, o mundo inteiro, meu Jesus.

— “Vai em paz, minha filha”.


[1] Na cópia de Balasar, este parágrafo que aqui se coloca a abrir o diário deste sábado, vem no seu final.

   

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